Em entrevista publicada na Folha de S.Paulo no dia 04.06, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), declarou que concederia indulto ao ex-presidente Jair Bolsonaro, caso seja eleito presidente da República. A declaração veio acompanhada de relativizações sobre o período da ditadura militar no Brasil. “Tudo é questão de interpretação”, disse Zema, ao ser questionado se reconhece que o país viveu uma ditadura entre 1964 e 1985.
A entrevista revela um movimento político preocupante: um governador eleito democraticamente relativizando um dos períodos mais sombrios da história brasileira, em uma aparente tentativa de agradar setores mais radicais do bolsonarismo. Ao prometer indulto a Bolsonaro, investigado por participar de articulações golpistas que resultaram na tentativa de subversão do processo democrático brasileiro, Zema se alinha a um discurso que busca reescrever o passado e normalizar ataques à democracia.
As ações de Bolsonaro e seus aliados, atualmente investigadas por órgãos como a Polícia Federal e o Supremo Tribunal Federal (STF), envolvem a elaboração de uma “minuta golpista”, planos para assassinar e prender autoridades, inclusive ministros do STF e o próprio presidente da República, além da incitação direta aos atos antidemocráticos de 08.01.2023, que resultaram na invasão e destruição das sedes dos Três Poderes em Brasília.
Zema tentou justificar a ideia de indulto citando a Lei da Anistia de 1979, que perdoou tanto opositores quanto agentes do regime militar. Contudo, essa comparação ignora o contexto histórico e o objetivo da anistia da época. A Lei nº 6.683, de 1979, sancionada durante o processo de abertura do regime militar, visava à pacificação nacional e ao início da redemocratização do país. Apesar das críticas à sua abrangência, a anistia foi parte de um esforço para restaurar o Estado democrático de direito.
Hoje, qualquer tentativa de reeditar uma anistia ou conceder indulto a envolvidos em ações que atentam contra a democracia tem um caráter oposto, pois não fortalece a democracia e caracteriza uma autêntica ameaça. Trata-se de uma manobra política para proteger aliados acusados de crimes graves, em um momento em que o Brasil tenta preservar suas instituições diante de ataques cada vez mais explícitos.
É alarmante que esse tipo de posicionamento seja adotado não apenas por Zema, mas também por outros governadores, como Tarcísio de Freitas (SP) e Ratinho Junior (PR), além de deputados federais e senadores eleitos por meio do voto direto. Ao defenderem quem tramou contra as eleições, alimentam pessoas que duvidam do sistema eletrônico de votação, tentam deslegitimar a Justiça Eleitoral e alimenta teorias conspiratórias que corroem a confiança na democracia brasileira.
A anistia de 1979 ocorreu em nome da redemocratização. O que se propõe agora é o oposto: o perdão para quem tentou destruir essa democracia. E isso, a história há de registrar, não pode ser aceito como interpretação — mas como ameaça real à liberdade e ao Estado de Direito.