Uma investigação da Polícia Federal (PF) revelou um sofisticado esquema criminoso que atuou por pelo menos cinco anos desviando benefícios sociais de pessoas em situação de vulnerabilidade. A quadrilha, liderada por Felipe Quaresma Couto, utilizava disfarces como perucas, pinturas faciais e até inteligência artificial para burlar o sistema de segurança do aplicativo Caixa Tem. Parte fundamental do esquema envolvia a cooptação de funcionários da Caixa Econômica Federal e de casas lotéricas.

A reportagem que trouxe à tona os detalhes do caso foi exibida pelo Fantástico, no domingo (21). Segundo a PF, o golpe consistia na alteração de cadastros de beneficiários: funcionários da Caixa envolvidos apagavam os dados reais e criavam novos perfis com e-mails e celulares diferentes, mantendo apenas CPF, nome e data de nascimento. Isso permitia que o dinheiro dos programas sociais fosse redirecionado para contas controladas pelos criminosos.

Entre os benefícios fraudados estavam o Bolsa Família, o FGTS e o abono salarial. Para contornar o sistema de reconhecimento facial, a quadrilha usava selfies bem tiradas, muitas delas de “rostos virgens” — pessoas que nunca haviam se cadastrado no Caixa Tem —, inclusive moradores de rua. Além disso, a PF encontrou milhares de imagens geradas por inteligência artificial nos dispositivos dos investigados.

A quadrilha também utilizava disfarces físicos para validar novas identidades no sistema. Em conversas interceptadas, Felipe Quaresma e outros membros relatavam o uso de perucas, alteração no corte de cabelo, pinturas no rosto e até barba falsa. “Vou até fazer a minha barba pra pintar a cara de novo”, disse um dos criminosos em uma das mensagens.

“Parceria do crime” e corrupção interna

De acordo com o delegado da PF, Wanderson Pinheiro da Silva, o grupo atuava com o apoio direto de funcionários da Caixa e de casas lotéricas. Em uma das mensagens obtidas pela polícia, Felipe informa a um comparsa que “16 horas o gera começa a soltar”, em referência a um gerente da agência. Um dos funcionários envolvidos chegou a receber mais de R$ 300 mil em propina.

O funcionário facilitava o acesso ao Caixa Tem, permitindo aos criminosos alterar dados cadastrais e biométricos. Essa articulação foi chamada pela PF de “parceria do crime”, dada a gravidade e o impacto do esquema, principalmente entre as vítimas de baixa renda, que, ao deixarem de receber os benefícios, enfrentavam dificuldades e desgaste emocional.

Resposta da Caixa e prisões

A Caixa Econômica Federal afirmou que participou das investigações e afastou os funcionários envolvidos. O banco informou que atualiza diariamente seus sistemas de segurança e está criando uma diretoria específica para cibersegurança. Anderson Possa, vice-presidente de segurança, logística e operações, destacou que o setor bancário trabalha de forma integrada para aprimorar os mecanismos de proteção contra crimes cibernéticos.

Felipe Quaresma, monitorado pela PF desde 2022, foi preso na última quinta-feira (18), no bar onde trabalhava. Junto a ele, também foi detido Cristiano Bloise de Carvalho. Os celulares dos dois continham as fotos utilizadas nos disfarces. Quatro outros integrantes da quadrilha seguem foragidos.

Felipe e Cristiano já foram transferidos para o Complexo de Bangu, onde passaram por novo registro fotográfico, desta vez sem sorrisos. Eles responderão pelos crimes de estelionato qualificado, corrupção de funcionários públicos, inserção de dados falsos em sistema e organização criminosa. O caso reforça a necessidade de constante aprimoramento na segurança digital e na fiscalização interna de instituições financeiras.

Com informações do Metrópoles

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