A cadeia de escândalos de corrupção dos últimos anos mostrou que o patrimônio público tem poucos defensores – insuficientes para barrar os inúmeros e mancomunados agressores.
A “política nacional” se fragmenta numa miríade de partidos, sócios no butim bilionário apelidado de Fundos “Partidário” e “Eleitoral”, inventados supostamente para eliminar a corrupção que na prática ampliou o festival de malandragem e aberrações.
As receitas públicas, destinadas ao bem de todos, que ficam sob a governança do eleito e de seus nomeados, embora “protegidas” por uma densa e complexa legislação, acabam por não atender as principais demandas sociais. A comunidade continua maltratada, e os desvios, gerando fortunas de malandros.
Nota-se que a prática de crimes envelhece e esgarça a personalidade dos infratores, figuras que passam a se medir não por aquilo que são (desastres humanos), mas por aquilo que possuem e ostentam. Vivem em círculos em que a cota de sensibilidade cívica é nula. Carros de luxo, joias, extravagâncias, ostentação, acúmulo de fortunas estonteantes e imerecidas, exatamente aquilo que o demônio ofereceu no deserto e não foi aceito pelo Mestre. Nada que possa dar paz à consciência e a felicidade da paz interior.
Essa fauna política acabou se impondo, controlando o país. Provocando dívidas impagáveis, fortalecendo a criminalidade e decretando o abandono das finalidades sociais do Estado. Poucos se enriquecendo, e a multidão sofrendo.
O resultado deplorável não sensibiliza as consciências surdas. Não toca aqueles cínicos que se apresentaram como os defensores dos oprimidos, para traí-los sem pudor.
A corrupção e a prevaricação são, em qualquer hipótese, crimes que deveriam ser tratados como hediondos e imprescritíveis, já que diretamente castigam os mais indefesos da sociedade.
A fiscalização da coisa pública é tremendamente falha, sem foco, sem metas fixadas. É exercida, em alguns casos, por diretos cúmplices dos corruptos. É, ainda, demorada ou ausente na recuperação dos desvios e roubos, que raramente acontece.
Nos últimos anos tem se assistido aos acordos de leniência, que são ridículos e irrisórios. Empresas envolvidas em dezenas de bilhões em corrupção são perdoadas ao assinarem acordos para pagar em 20 anos menos de 5% do montante roubado! Já um contribuinte é penalizado a pagar integralmente, com correção monetária, multas de 100% e juros. A leniência é absurdamente irrisória, desproporcional em relação a infrações de menor gravidade e deixa dúvidas se os órgãos que tratam os acordos são vulneráveis aos esquemas de corrupção.
Num país decente, pessoas que aprontaram o que foi revelado ficariam presas por dezenas de anos, teriam todos os bens confiscados e leiloados para o melhor ofertante.
As quadrilhas se formam com os nomeados pelo governante. No enredo entra uma espessa nuvem ilusória de marketing, concede-se importância e prioridade para obras e investimentos que têm apenas o fito de enriquecer políticos e seus financiadores de campanha. O mecanismo de assalto generalizou-se com a participação de grupos poderosos.
Enumerar os métodos de arrombamento dos cofres públicos ocuparia muitas páginas. É mais fácil dizer o que se salvou nesta época de degeneração.
Quase nada escapou à exploração, em certos municípios e Estados conclui-se que tudo foi loteado, superfaturado, sugado, surrado e desperdiçado, como lavouras atacadas por nuvens de gafanhotos.
Mas como pôde se chegar a isso? Tudo começa com um primeiro ato, que determina a perda de autoridade do governante.
Aquele que fecha os olhos aos pequenos crimes um dia passará a fechar aos grandes, e pior é aquele governante que, por meio dos seus atos de improbidade, perde autoridade moral e fica refém dos exploradores insaciáveis.
Estados e prefeituras que mergulharam na falência seguiram ladeira abaixo num inexorável apodrecimento moral.
Apesar de uma exemplar operação Lava Jato, detestada pelos partidos que tentam enjaulá-la, a força do mal persiste debaixo das cinzas e ameaça, como fênix, reacender-se. Exatamente como aconteceu com as CPIs dos anos de 1993 e 1994, o expurgo de Fernando Collor e a confraria dos “Sete Anões”, que no Congresso Nacional montaram uma máquina de corrupção junto com as mesmas empreiteiras da Lava Jato. Não foi suficiente eliminar uma dezena de políticos. Salvaram-se figuras como Geddel Vieira Lima, encrencadas por pequenas propinas e que, em 2018, 24 anos depois, não conseguiram explicar os R$ 50 milhões escondidos num apartamento em Salvador.
Embora tenha acontecido a maior renovação do Congresso e das Assembleias estaduais, o ano de 2019 não pode ser visto ainda com um ano que virou uma página.
O vírus da malandragem está vivo e resistente, pronto para outras desgraças.

 

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