Leva o nome de ‘All the world’s futures’ (Todos os futuros do mundo), com curadoria do nigeriano Okwui Enwezor, a mostra principal da 56ª Bienal de Veneza, que será realizada entre 5 de maio e 22 de novembro. A única brasileira a participar da exposição é uma senhora elegante, ousada, dona de obra singular: Sônia Gomes.
A artista nasceu em Caetanópolis (MG), vive e trabalha em Belo Horizonte desde 1980, é criadora respeitada, mas com presença rarefeita no circuito de galerias tanto local quanto nacional. Sônia sintetiza sua própria história numa frase: “Chutei o balde, abandonei tudo para me dedicar exclusivamente à arte”. Para ela, a arte é uma atividade egoísta, avessa a conviver com outras atividades. “Como arte cobra dedicação, complica tudo, às vezes até o casamento”, observa.
Unindo tecidos diferentes (já houve época em que se valeu de roupas usadas) com nós, torções, costuras, Sônia Gomes cria objetos, esculturas e instalações. Lança mão de texturas, cores e formas, para criar peças que têm poder de evocar referências amplas. Tanto podem se referir a culturas regionais quanto universais. Podem chamar à discussão sobre a história da arte ou dar vazão a considerações sobre o papel do inconsciente nas elaborações humanas.
A origem do trabalho de Sônia, como explica, está no hábito adolescente de usar panos para criar roupas, adornos, bolsas. “Sempre fui performática”. Com sorriso irônico, a artista indica que seus trajes chamavam a atenção pelo contraste com as roupas habituais. “Algumas pessoas foram se interessando pelo que eu fazia. Comecei a vender adornos, bolsas”, recorda. “Mas chegou um momento em que fui radicalizando. As peças viraram outra coisa, e ninguém queria comprar o que eu fazia. Talvez por ver nas peças a questão afro, que eu nunca sufoquei. Mas eu já estava interessa em agradar a mim e não aos outros”, afirma.
E foi assim que adornos que as lojas consideravam mal-acabados ganharam outro sentido quando ela ouviu da galerista Flávia Albuquerque que o que ela fazia era arte, e não artesanato. A artista plástica Mônica Sartori, com quem Sônia fez curso livre, endossou o comentário, diante de uma peça de retalhos que havia sido recusada em feira de patchwork.
Convite para a Bienal
O convite para participar da Bienal de Veneza veio após o curador-geral do evento, Okwui Enwezor, enviar e-mail pedindo que Sônia falasse do trabalho apresentado na mostra Made by…Feita por brasileiros, em 2014, na capital paulista. Em seguida, silêncio. “Como não mandaram dizer nada, cheguei a pensar que o sonho de ir a Veneza era algo muito distante para mim”, conta a artista. No final de 2014 veio a confirmação do convite e o pedido para que apresente trabalhos inéditos.
Como já tinha uma viagem marcada para a África do Sul, só a partir de janeiro ela pode se dedicar integralmente à realização das obras que vai mostrar. A primeira ideia, a partir das fotos que recebeu do local onde vai serão colocadas as obras, foi cobrir as colunas do prédio com tecidos. O curador sugeriu algumas peças de chão. Está pronto um conjunto de trabalhos, com peças apoiadas na parede, penduradas no teto e de chão, que são, para a artista, criaturas, colunas, trouxas.
Redação do Jornal Nova Imprensa Portal Uai