Passado um ano da tragédia provocada pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, o Congresso Nacional ainda não aprovou nenhuma proposta para endurecer a punição aos responsáveis por esse tipo de desastre – sejam pessoas ou empresas.

Em 25 de janeiro de 2019, uma sexta-feira, às 12h28, a barragem da mina Córrego do Feijão, da Vale, se rompeu e provocou um tsunami de lama que avançou sobre parte da cidade de Brumadinho. O rompimento deixou 259 pessoas mortas – 11 ainda estavam desaparecidas até esse sábado (25). Na cidade, crescem os casos de suicídio e doença mental em decorrência da tragédia.

Desde então, deputados e senadores apresentaram pelo menos 37 projetos com o objetivo de aprimorar a segurança em barragens, estipular multas e aumentar penas para responsáveis por rompimentos. Nenhum desses textos foi transformado em lei.

O Congresso também criou duas comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) – uma no Senado e outra na Câmara – e uma comissão externa de deputados para acompanhar a tragédia.

Juntas, as CPIs produziram cerca de 3 mil páginas de relatórios. A do Senado propôs o indiciamento da mineradora Vale, da empresa de consultoria TÜV SÜD e de 14 pessoas. A da Câmara sugeriu o indiciamento de 22 pessoas e das duas empresas.

Na última terça (21), o Ministério Público de Minas Gerais denunciou 16 pessoas, a Vale e a TÜV SÜD pelas mortes. Até o momento, no entanto, ninguém foi condenado pela Justiça.

Propostas

Um dos projetos apresentados pelos parlamentares após o desastre de Brumadinho estipula multa de até R$ 10 bilhões para responsáveis por falhas em barragens. A proposta altera a Política Nacional de Segurança de Barragens, criada em 2010.

O texto é de autoria da senadora Leila Barros (PSB-DF) e foi aprovado pelo Senado em fevereiro de 2019 – um mês após o desastre na cidade mineira. A proposta, porém, ainda não foi votada pela Câmara.

O projeto também proíbe a construção de reservatórios pelo método utilizado em Brumadinho, chamado “alteamento a montante”, que prevê o crescimento da barragem em degraus, utilizando o próprio rejeito da mineração.

A iniciativa resgata boa parte de um projeto apresentado no Senado em 2016 depois de outra tragédia com barragens: a de Mariana, que deixou 19 mortos em 2015. Essa proposta acabou arquivada, sem ser votada, no final de 2018.

A Câmara aprovou projetos que, entre outros pontos, aumentam para até R$ 1 bilhão o valor da multa para os responsáveis por desastres em barragens.

Esses textos resultaram, justamente, da comissão externa de deputados que acompanhou os desdobramentos da tragédia de Brumadinho. As iniciativas estão distribuídas entre comissões do Senado, mas ainda não chegaram à votação em plenário.

‘Ecocídio’ em tramitação

Dos projetos no Congresso, a tramitação mais avançada é a do texto que cria o crime de “ecocídio” para punir responsáveis por desastres ambientais de grande proporção.

O projeto aprovado pela Câmara em junho do ano passado recebeu o aval da Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado em outubro e seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, onde tramita atualmente.

O texto prevê pena de 4 a 12 anos de prisão, além de multa, para quem “causar desastre ambiental de grande proporção ou que produza estado de calamidade pública, com destruição significativa da flora ou mortandade de animais, em decorrência de contaminação ou poluição atmosférica, hídrica ou do solo”.

De acordo com a proposta, se o crime for culposo (sem intenção), a pena será de um a três anos de prisão, além de multa.

O projeto prevê, ainda:

que a pena seja aplicada independentemente da punição por homicídio, caso haja morte na tragédia;
que a punição seja diferenciada e mais rigorosa que a do crime de poluição, que é punível com até 5 anos de prisão pela legislação ambiental atual;
que a multa mínima prevista na lei passe de R$50 para R$2 mil, e a máxima, de R$50 milhões para R$1 bilhão;
que o crime de “dar causa a rompimento de barragem pela inobservância de legislação, de norma técnica, de licença ou de determinação da autoridade ambiental e da entidade fiscalizadora da segurança de barragem” passe a ser previsto em lei, com pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa.
que esse crime, na modalidade culposa (sem intenção), tenha pena de detenção de 1 a 3 anos e multa;
e que a apresentação de relatório total ou parcialmente falso sobre segurança de barragens seja adicionada à lista de práticas criminosas na legislação ambiental.

‘Queda de braço’

Coordenador da comissão externa da Câmara que acompanhou a tragédia de Brumadinho, o deputado Zé Silva (SD-MG) diz que uma “queda de braço” entre Câmara e Senado atrapalhou o andamento das propostas sobre barragens no Congresso.

O parlamentar lembra que, semanas depois da tragédia de Brumadinho, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais, estado com maior número de barragens de mineração, aprovou a Política Estadual de Segurança de Barragens.

O texto, com regras mais rigorosas, foi sancionado pelo governador Romeu Zema (Novo). Mas, na avaliação de Zé Silva, a legislação federal sobre barragens é “frágil” e precisa ser atualizada.

“Em Mariana, por exemplo, foi feita a investigação, chegou-se aos fatos, mas quando o Poder Judiciário foi sentenciar não estava previsto o crime de apresentação de documento falso, não tinha crime por rompimento de barragens. O ecocídio não estava tipificado. O nosso projeto do ecocídio vai dar segurança ao juiz na hora da sentença”, disse.

 

Fonte: G1||
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