Exames de sangue feitos em Manaus mostram que a dengue tipo 4, uma variante dessa doença viral que não era identificada no Brasil desde 1982, está de volta ao país. Embora a infecção por essa forma do vírus (o DENV-4, como o chamam os especialistas) não seja, por si só, muito agressiva, o retorno dela é, ainda sim, uma má notícia para a saúde pública brasileira. Isso porque as pessoas que já tiveram alguma das outras três formas da dengue não estão imunes contra o DENV-4 — e a reinfecção com a doença aumenta a chance de que elas desenvolvam a forma hemorrágica da doença, muito mais letal.
A descoberta está descrita num artigo na edição de abril da revista científica Emerging Infectious Diseases, assinado por uma equipe de pesquisadores do Amazonas. Segundo a primeira autora do estudo, Regina Maria Pinto de Figueiredo, da Fundação de Medicina Tropical do Amazonas, a identificação do DENV-4 em três pacientes que vivem e trabalham em Manaus não deixa margem para dúvidas.
Essas primeiras amostras vieram de pessoas que não tinham viajado para fora do país. Mas, depois disso, achamos um paciente que tinha estado na Venezuela, conta a pesquisadora. A conexão com o país caribenho faz sentido quando se leva em conta o fato de que essa forma da dengue é endêmica — ou seja, bastante comum — tanto no território venezuelano quanto no colombiano. É a segunda vez que o DENV-4 é isolado no Brasil — antes disso, tal variante do vírus havia sido encontrada no ano de 1982, em Roraima.

Da malária à dengue
Para chegar à identificação, os pesquisadores analisaram o sangue de pacientes com sintomas que, inicialmente, lembravam os da malária. Existe uma semelhança nos sintomas das duas doenças e, na fundação, costumamos usar isso para ajudar na triagem dos possíveis pacientes de dengue, explica pesquisadora.
A presença do DENV-4 — em um dos pacientes, já convivendo com o DENV-3, ou tipo 3 do vírus — foi confirmada por meio de anticorpos específicos dessa forma do parasita e também pela análise do material genético viral (que, diferentemente do nosso, se resume ao RNA, a molécula-irmã do DNA).
Por enquanto, há poucos indícios de que o DENV-4, sozinho, seja capaz de causar muito estrago. Na Colômbia, por exemplo, é mais comum que as pessoas com DENV-2 desenvolvam dengue hemorrágica. O problema, lembra Figueiredo, é que a nossa população já foi infectada amplamente com os outros tipos do vírus. No caso da dengue, trata-se do pior dos mundos: se por um lado o sistema de defesa do organismo já possui uma memória da infecção pela doença, o efeito de um novo subtipo do vírus é exacerbar a resposta defensiva de forma que favorece justamente o aparecimento da dengue hemorrágica.
Quais as chances de o DENV-4 se espalhar para o resto do Brasil? Altas, diz acreditar a pesquisadora. É muito comum o pessoal daqui [de Manaus] ir passar férias na Bahia e no Rio de Janeiro. E também há muitos turistas de outras regiões que visitam Manaus. Bastaria uma picada de mosquito para passar a infecção adiante. Um evento, aliás, que já pode ter acontecido — embora o DENV-4 só tenha sido flagrado agora, não dá para garantir que ele não esteja circulando há mais tempo pelo Brasil.

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