Quando da análise dos fatos não conseguimos confirmar as afirmações do atual governo de não ter havido Golpe em 1964, ditadura e sim uma decisão soberana da sociedade.

Em 1964 houve um atentado, um Golpe de Estado, perpetrado por militares, com uso de equipamentos bélicos, pagos com dinheiro público.

Não foi uma decisão soberana da sociedade. Foi um golpe arquitetado dentro do governo, por militares que tinham a obrigação constitucional de proteger a ordem, com o objetivo de retirar os políticos eleitos do poder. Foi instalado um governo provisório militar, que indicou um militar para presidente e foi referendado, em eleição indireta, por um Congresso Nacional subjugado pela opressão.

Também o ocorrido não foi contra-revolução, pois em 1964 não havia um movimento armado, nenhum tiro ou resistência foi feita pela esquerda.

Essa discussão sobre ter havido golpe, contra-revolução ou revolução mereceria uma análise mais longa. A única certeza é ter sido cometido um atentado contra a democracia pelas forças armadas, com a prática de indisciplina e contra a hierarquia, com retirada do poder da autoridade suprema, o Presidente da República, e ao não garantirem a ordem constitucional, nos termos dos artigos 87, inciso XI, 176 e 177, da Constituição de 1946, em vigor na época.

A polêmica acirra mais, quando Jair Bolsonaro determinou para a data de 31 de março ser “rememorada” em eventos organizados nas instalações militares e o Governo divulgou vídeo em sua defesa, mostrando ter respeito pelas Forças Armadas e não ter o mesmo sentimento pelas famílias das mais de 400 pessoas mortas ou desaparecidas.

Poder-se-ia pensar em rever a Lei de Anistia (Lei 6.683, de 1979), a qual anistiou os que cometeram crimes políticos ou conexos. Entretanto, a revisão tem empecilhos legais e, por seu caráter penal, afrontaria à vedação da retroatividade de lei penal maléfica ao réu, prevista no inciso XL, do artigo 5, da Constituição Federal.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento no dia 29 de abril de 2010, da Ação Declaratória de Preceito Fundamental 153/DF, reconheceu o caráter bilateral, amplo e geral da anistia, prevista na Lei 6.683, de 1979, e reconheceu ser ela fator importante para a transição democrática. Além disso, a Lei de Anistia foi reafirmada no artigo 4, da Emenda Constitucional 26/85, a qual convocou a Assembleia Nacional Constituinte.

Cinquenta e cinco anos depois, as feridas do Golpe de 1964 continuam abertas e não foram esquecidas, dividem o país.

Devemos respeitar os diversos sentimentos das pessoas nesse período sofrido de nossa história. Por sermos um país democrático, com ideais e sentimentos plurais, ao mesmo tempo que os militares podem comemorar a data de 31 de março de 1964, também as pessoas sofridas com a perda de seus entes queridos podem manifestar o seu descontentamento e indignação.

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