Na semana passada, a Sociedade Americana de Geriatria (American Gereiatrics Society) realizou um evento on-line que originalmente estava marcado para seu encontro científico anual, abalroado pela pandemia.

Na conferência virtual, foram apresentados três trabalhos relacionados a medicamentos. Idosos recebem um volume de prescrições maior do que qualquer outro grupo etário e, se remédios desempenham um papel fundamental para manter a saúde e o bem-estar dos indivíduos, também podem provocar problemas. A grande questão é: qual é o patamar seguro e benéfico?

Há uma extensa relação de drogas cuja utilização está associada ao risco de quedas: benzodiazepínicos, receitados para quem tem problemas de ansiedade e insônia; antipsicóticos, para dificuldades de comportamento que ocorrem no Alzheimer e outras demências; antidepressivos; opioides; anti-hipertensivos; e aqueles para baixar as taxas de açúcar no sangue, que podem levar a um quadro de hipoglicemia.

Zachary Marcum, professor de farmácia da University of Washington, em Seattle, apresentou um estudo promissor fruto do trabalho de pesquisadores dos Estados Unidos e da Holanda, que testou o motivo de alguns medicamentos para controlar a hipertensão levarem a um risco menor para demência. Esse efeito estaria associado à ação do hormônio angiotensina-II junto a receptores do organismo. Foram analisados os diagnósticos de demência de mais de 1.900 pessoas, entre 70 e 78 anos. A demência ocorreu em 5.6% dos indivíduos que utilizavam anti-hipertensivos que aumentaram a atividade do hormônio angiotensina-II, enquanto 8.2% dos diagnosticados com a doença se valiam de medicação que diminuía a atividade do mesmo hormônio. Com os ajustes de fatores de risco e histórico de saúde, os participantes que usavam medicamentos que aumentavam a atividade da angiotensina-II tinham uma taxa 44% menor de demência, ou seja, eles funcionariam como uma proteção para o cérebro. “Este é o primeiro passo para uma ´hipótese da angiotensina’, que pode se tornar uma estratégia de tratamento importante para idosos”, sintetizou.

A doutora em farmácia Kristin Smith trouxe uma iniciativa de desprescrição de medicamentos a veteranos. O programa-piloto chama-se FAME (Falls Assessment of Medications in the Elderly) e se destina a indivíduos acima dos 65 anos. Através de consultas virtuais, o time de especialistas faz uma sugestão de diminuição no número de remédios e a recomendação é enviada para o médico responsável. “Em 93% dos casos, os clínicos aceitaram a desprescrição de pelo menos uma droga; no caso de psiquiatras, a concordância foi um pouco menor: 70%. Dos pacientes que participaram, 70% concordaram em retirar um medicamento e o importante é que não tivemos nenhum evento adverso”, explicou a pesquisadora.

Diversos estudos foram publicados ao longo do mês de junho sobre o tema. Um desses questionava o uso de estatinas, utilizadas para controlar os níveis do colesterol e evitar doenças cardiovasculares, em pacientes no final da vida que se encontravam em instituições de longa permanência. Em pesquisas recentes, que incluíram gente acima dos 75 anos, a conclusão é de que a droga não ajudava na prevenção da doença. Na verdade, a miopatia, cujos sintomas são dores e fraqueza muscular, é um dos efeitos colaterais mais relatados das estatinas – problema que pode afetar de modo dramático idosos frágeis, que já estão num processo de declínio físico.

Outro se debruçava sobre o tratamento contra o diabetes em idosos no fim da vida. Uma em cada quatro pessoas acima dos 65 anos tem a enfermidade, que com frequência leva a doenças cardiovasculares. A orientação para retardar sua progressão e complicações é manter um rígido controle dos níveis de açúcar no sangue. Os níveis normais de hemoglobina glicada (ou hemoglobina glicosilada, ou simplesmente HbA1c) não devem ultrapassar 5.7%. Em diabéticos mais jovens, o patamar não poderia ultrapassar de 6.5% a 7%. Entretanto, para idosos com baixa expectativa de vida ou que tenham demência, manter o nível de açúcar baixo embute o risco de causar mais danos do que benefícios, por causa de episódios de hipoglicemia que podem levar à perda de consciência e quedas. Especialistas têm revisto as orientações e levantado a marca para algo entre 8% e 9% para esse grupo. Resumo da ópera: nada é tão simples como parece.

Fonte: Bem Estar

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