A cada hora, um processo relacionado à Lei Maria da Penha prescreve (perde a validade) em Minas Gerais – uma média de 25 ações por dia. De 2011 até julho deste ano, 51.020 processos não foram julgados no tempo estipulado pela legislação, conforme dados do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). O índice inclui casos em que a queixa foi retirada pela vítima. Para a juíza Maria Luiza Santana Assunção, da 16º Vara Cível, que cuida de registros de violência contra a mulher, o gargalo está na demora da investigação realizada pela Polícia Civil.

Na análise da magistrada, a fase de inquérito obstrui 50% das ações. “Eles (polícia) pedem mais prazo, eu despacho e volta sem alteração. Há falta de investigadores, de estrutura”, avalia. No início de outubro, o gabinete de Maria Luiza analisa processos com data de 2014. O prazo de prescrição em casos de ameaça, por exemplo, é de três anos contados a partir do dia em que ocorreu o crime. Muitas vezes, esse também é o tempo que o processo demora para chegar às mãos de um juiz. “São três anos para apurar, concluir e denunciar. Às vezes, quando chega até aqui (na vara) já tem três anos”, revela a magistrada.

Em perigo

Enquanto prazos são descumpridos, mulheres sofrem ameaças diárias.

A maior preocupação da jovem são as filhas que teve com o agressor, de 5 e 6 anos. “Em fevereiro tem uma audiência de custódia. Não quero que elas tenham que passar os fins de semana com ele”, diz.

Mutirão

A Polícia Civil reconhece o problema e diz que está realizando mutirões para regularizar a situação. O projeto Remodelagem começou em 2016 e pretende concluir inquéritos anteriores a 2014. Uma delegada, uma escrivã e dois investigadores trabalham exclusivamente nessa ação.

Segundo assessoria da corporação, a Divisão de Atendimento à Mulher remeteu 400 processos anteriores a 2014 para a Justiça no mês de setembro.

No mesmo mês, a divisão iniciou outra força-tarefa para concluir inquéritos que podem prescrever em 2017. A expectativa é que o trabalho termine em dezembro. Conforme a polícia, a análise dos inquéritos a prescrever foi sistematizada internamente, e todos os agentes estão empenhados no mutirão. São realizadas, em média, 1.080 oitivas por semana.

Ajuda

Psicológico. Uma psicóloga voluntária ajuda vítimas de violência que têm processos tramitando na 16ª Vara Cível de BH. “Elas precisam trabalhar o empoderamento para quebrar o ciclo”, diz a juíza Maria Luiza.

Saiba mais

Causa. A promotora de Justiça Patrícia Habkouk, da 18ª Promotoria de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, considera “que o alto número de feitos (processos ativos) existentes reflete o quanto a violência contra a mulher é elevada”.

Estrutura. No Estado, existem 71 unidades de atendimento à mulher, sendo seis em Belo Horizonte e uma em cada Delegacia Regional (com exceção das regionais de Belo Horizonte). Toda delegacia possui, no mínimo, um delegado titular e sua respectiva equipe de escrivães e investigadores. A Polícia Civil nomeou neste ano 945 novos investigadores que reforçarão também o quadro das delegacias de mulheres.

Reincidência de agressores é preocupante

A estrutura do poder Judiciário também precisa ser aprimorada, segundo a juíza Maria Luiza Santana Assunção. Em Belo Horizonte, são quatro juízes e oito promotores nas quatro varas criminais. “Isso aqui é uma luta. A gente fica das 8h às 20h fazendo audiência para ver se barra a prescrição”, afirma.

Entretanto, a magistrada considera que a reincidência dos agressores é pior que a prescrição. Na 16ª Vara Cível, há casos em que o homem é citado em 14 boletins de ocorrência. “Por isso, estamos ampliando os grupos reflexivos. Homem resiste a discutir a relação e não vai ao psicólogo”, afirma. A juíza tem preferido aliar as medidas protetivas com encaminhamentos para grupos.

 

Fonte: O Tempo Online ||

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