Levantamento feito pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, revela que Minas Gerais é o Estado que mais possui presos trabalhando proporcionalmente à sua população carcerária. Hoje são cerca de 6.700 detentos atuando em atividades dentro e fora das unidades prisionais geridas pela Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi), da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds).
O programa ?Trabalhando a Cidadania?, desenvolvido pela Superintendência de Atendimento ao Preso (Sape) oferece dignidade aos presos por meio de uma política de humanização. O programa prevê a reinserção social de indivíduos privados de liberdade com ações planejadas e coordenadas, que procuram atender o preso em todas as suas vertentes. Para isso, conta com o apoio técnico de uma equipe interdisciplinar composta por médicos, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais, educadores, advogados, administradores, entre outros profissionais.
Desafios
O superintendente da Sape, Guilherme Augusto Faria Soares, atesta que a utilização da mão de obra de presos é uma poderosa ferramenta de ressocialização. ?O trabalho é uma ponte para um futuro vivido com dignidade. E, para isso, precisamos da participação efetiva da sociedade, que é um dos pilares desse processo. Nossos desafios são educar, treinar e preparar esses indivíduos, devolvendo-os à sociedade como cidadãos recuperados?, explica.
Para que isso aconteça, tem sido firmadas parcerias com empresas de pequeno, médio e grande porte, órgãos da administração municipal e estadual, por meio da assinatura de termos de cooperação técnica, que hoje chegam a mais de 200. O estabelecimento do convênio com a Seds para absorção de mão de obra de detentos exige alguns procedimentos específicos por parte dos interessados. Em primeiro lugar, é preciso ir à unidade prisional e procurar o gerente de produção. Na sequência, o preenchimento de um formulário com os dados da empresa. De posse do documento, o gerente o enviará para a Diretoria de Trabalho e Profissionalização que avaliará o conteúdo. Se a proposta for aprovada, será confeccionado termo de cooperação técnica e plano de trabalho para que se dê início efetivo à parceria.
Modernização
Um dos destaques do ?Trabalhando a Cidadania? é a modernização, via sistema de Informações Penitenciárias (Infopen), que permite minimizar os trâmites burocráticos graças a um cadastro único de presos. O diretor de Trabalho e Produção da Suapi, Helil Bruzadelli, informa que Minas Gerais é o primeiro Estado a ter um sistema totalmente informatizado. ?Ele possibilita, no Módulo de Trabalho, que todos os fluxos de informação entre as unidades prisionais e a diretoria possam ser mais ágeis e fidedignos. O sistema é capaz de emitir atestados de dias trabalhados ao Tribunal de Justiça para fins de remissão, assim como a quantificação, dia a dia, da evolução de presos trabalhando, as parcerias, a produção da unidade, oficinas e profissionalização?, enumera.
Minas também será pioneira no quesito pagamento de presos. Um convênio entre a Seds, Banco do Brasil e Visanet permitirá que o detento que exerce atividade remunerada seja regularizado junto à Receita Federal por meio do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), recebendo o salário via cartão magnético. ?Isso trará mais segurança, transparência e agilidade, não somente aos presos, como também às suas famílias?, afirma Helil.
Parcerias
Entre as várias parcerias firmadas com a Seds para aproveitamento da mão de obra de detentos está a empresa multinacional Da Granja, do grupo Marfrig, parceira do Presídio de Passos, no Sul do Estado. Ela contratou 30 presos, podendo chegar a 55, com remuneração de um salário (R$ 510,00), mais cartão de alimentação no valor de R$ 63,00. Os detentos beneficiados são dos regimes fechado e semiaberto.
A detenta Cláudia Cristina Mezêncio é uma das selecionadas para trabalhar na empresa. ?Para mim, foi a melhor coisa que podia ter acontecido. Ninguém pode imaginar o tamanho da minha satisfação em mandar dinheiro para ajudar os meus filhos, mesmo estando presa. Isso não tem preço?, testemunha.
Oportunidades
A Prefeitura Municipal de Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), também tem dado oportunidade a 160 detentos dos regimes aberto e semiaberto, custodiados nas unidades prisionais da cidade. As atividades exercidas vão desde capina e jardinagem a serviços de pedreiro, eletricista, bombeiro hidráulico, conservação em geral e reforma de uniformes para a rede pública municipal de saúde. A remuneração dos presos fica por conta da Seds, de acordo com o disposto na Lei de Execuções Penais, ou seja, três quartos do salário mínimo (R$ 348,75).
A empresa Colchões Toraflex, que paga ¾ do salário mínimo a cerca de dez presos da Penitenciária Professor Jason Soares de Albergaria, no município de São Joaquim de Bicas, também na RMBH, é outra parceira. O dono empresa, Márcio Eustáquio da Silva relata sua experiência. ?Resolvi ajudar no processo de ressocialização de detentos. Quase 10% dos meus funcionários são presos. Quatro deles, depois que se desvincularam do sistema, foram contratados. Os funcionários nessa condição apresentam um rendimento bem superior aos outros trabalhadores, mostrando-se mais responsáveis e aplicados?, conta.
Benefícios
Todos os presos que trabalham são beneficiados com a remissão de pena, ou seja, a cada três dias trabalhados, menos um no cumprimento da pena. Além disso, é necessário que haja autorização judicial. Quanto ao valor recebido, mínimo de 75% do salário, metade é entregue ao preso e a outra metade é dividida da seguinte forma: 25% para o pecúlio (conta em banco resgatada após o desligamento do sistema), e 25% para o Estado, como forma de ressarcimento.
Ensino e Profissionalização
Graças à modernização e expansão do sistema, dezenas de oficinas foram implantadas nas unidades prisionais, proporcionando aos detentos cursos profissionalizantes. É uma interface criada pela Superintendência de Atendimento ao Preso (Sape) para aliar teoria e prática. A diretora de Ensino e Profissionalização da Suapi, Sandra Regina Lopo, ressalta que os cursos contribuem para o desenvolvimento e a promoção social, por meio da formação e da qualificação profissional. ?O ensino e o trabalho devem andar sempre juntos, porque é necessário ter uma bagagem mínima para atuar depois. A Diretoria de Trabalho e Produção fecha a parceria e nós propomos o curso, com posterior certificação. Dessa forma, gerentes de produção e pedagogos das unidades prisionais atuam conjuntamente e de maneira alinhada?, disse.
O Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) renovou convênio com a Diretoria, beneficiando 16 unidades prisionais em todo o Estado com cursos de agricultura, agropecuária, cultivo de grãos e plantas, fruticultura, olericultura, floricultura e plantas ornamentais, entre outros. Para o segundo semestre deste ano, está previsto o oferecimento de cursos de mecânica, marcenaria, tornearia, serralheria, costura completa, costura overlock e reta, padaria, pré-moldados e concretos, dessa vez contemplando presos de 47 de unidades.