Uma mulher de 82 anos foi resgatada da residência de uma médica e de um empresário, em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo (SP), após ser mantida em regime análogo à escravidão por 27 anos, segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT).

De acordo com informações divulgadas nesta quarta-feira (7) pelo MPT, a empregada doméstica não teve acesso a salário nem folga por quase três décadas.

Na sexta-feira (2), a Justiça bloqueou R$ 815,3 mil em bens dos acusados. O montante será transferido para a mulher, com objetivo de reparação pelos abusos praticados pelos empregadores, informou o órgão.

Ainda de acordo com o MPT, a idosa, uma mulher negra e analfabeta, trabalhava com a esperança de que a patroa estivesse juntando dinheiro para que ela realizasse o sonho de comprar a casa própria.

No entanto, provas obtidas pelo MPT indicam que os patrões deixaram de pagar os salários, com a justificativa de que estariam “guardando dinheiro para ela“.

Além do MPT, a força-tarefa deflagrada em 24 de outubro contou com membros do Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) e da Polícia Militar (PM).

 

Resgate

O inquérito civil foi instaurado após o recebimento de uma denúncia anônima. A diligência foi conduzida pelo procurador, Henrique Correia, e pelos auditores fiscais do trabalho, Sandra Ferreira Gonçalves, Jamile Virgínio e Cláudio Rogério Lima Bastos, além de policiais militares.

Em depoimento, a vítima contou que os patrões enviaram aproximadamente R$ 100 todos os meses ao seu irmão, que mora em Jardinópolis (SP), a 22,6 quilômetros de Ribeirão Preto.

A idosa é inscrita no Benefício Previdenciário Continuado (BPC), mas a médica impedia que a empregada tivesse acesso ao cartão de saque, segundo o MPT.

A trabalhadora fazia referência à empregadora como aquela que provia tudo o que ela precisava. Na verdade, a empregada possuía um benefício assistencial, e a empregadora fazia o gerenciamento daquele recurso e adquiria os gêneros de primeira necessidade para a trabalhadora com esses recursos que eram passados pelo governo. Salário nunca recebeu“, alega Virgínio.

 

‘Cedida’ ao casal

Segundo o procurador Henrique Correia, a mulher começou a trabalhar como doméstica na infância, na casa de outra família. Ela se mudou para o imóvel do empresário e da médica após a morte da antiga patroa.

Mulher, negra, de origem humilde, analfabeta. Ela é mais um exemplo de interseccionalidade, uma vez que evidencia a sobreposição de opressões e discriminações existentes em nossa sociedade, as quais permitiram que tantos anos se passassem sem que a presente situação de exploração fosse descoberta pela comunidade que rodeava a família”, diz o procurador.

O Ministério Público do Trabalho afirma que a médica se dirigiu a uma auditora fiscal, por duas ocasiões, com frases agressivas, como “minha vontade era te esganar“, e “queria te bater, se pudesse“.

O órgão aponta que a mulher tentou atrapalhar o processo fiscal, primeiramente tentando deixar a residência com a empregada e, depois, evitando que a idosa fosse identificada, impedindo a entrega dos documentos pessoais.

Segundo o relatório das diligências, a idosa agia com submissão em relação à patroa, que havia lhe prometido a compra de uma casa. Além dos bens, a transferência de um veículo do casal também foi bloqueada.

A vítima foi encaminhada à Defensoria Pública da União (DPU). O casal pode ser incluído na chamada “lista suja” do trabalho escravo, cadastro que reúne empregadores que submeteram os empregados a condições análogas à escravidão.

 

Fonte: G1

 

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