O conflito entre as mineradoras e órgãos ambientais está se tornando preocupante na vizinha cidade de Pains, que é um município conhecido pela riqueza calcária e presenteado com inúmeras cavernas. O problema é que a atividade de mineração estaria ameaçando bens naturais que são patrimônios nacionais.
Para tentar resolver o impasse, a Prefeitura de Pains propôs a criação de uma área de preservação, conhecida como Monumento Natural Jardim do Éden. Segundo informou o representante do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) do Alto São Francisco, Dirceu de Oliveira Costa, dentro de 10 a 15 dias deve ser baixado um decreto criando a área de preservação. Com isso, as mineradoras que atuam nessa área não poderão desenvolver suas atividades.
O prefeito de Pains, Ronaldo Márcio Gonçalves/PT, solicitou ao departamento jurídico que avaliasse a necessidade de indenizações. De acordo com Dirceu Costa, o prefeito estaria em Brasília nesta quinta-feira (16), para tentar resolver a questão. A redação não conseguiu falar com o prefeito Ronaldo até o fechamento da edição.
O impasse está tomando repercussão estadual e até nacional. Na semana passada, a briga entre as mineradoras e órgãos ambientais foi destaque em um dos maiores jornais de grande circulação no Estado, o Hoje em Dia, de Belo Horizonte.
Como ressalta a reportagem, os estrondos provocados pelas explosões de cargas de até 600 quilos de dinamite são precedidos de abalos no solo e nas moradias. Os prejuízos são visíveis a olho nu: janelas trepidam, as trincas e rachaduras nas casas aumentam a cada dia. A população de Pains é obrigada a conviver em meio à constante poeira, o que coloca em risco a saúde dos moradores.
As bombas usadas pelas mineradoras são apontadas como causas das quedas de pedaços inteiros do Complexo Espeleológico Jardim do Éden, local que abriga uma caverna que leva o mesmo nome, sendo uma das mais importantes e misteriosas do país.
Pesquisadores e ambientalistas apontam que a região cárstica de Pains atualmente é a mais ameaçada do Estado e uma das que despertam maior preocupação devido à sua importância natural.
Além das fortes explosões, as mineradoras são responsáveis pelo tráfego pesado de veículos sobre o complexo espeleológico. Os moradores reclamam constantemente da poluição ambiental e ambientalistas lutam para que seja criada uma área preservada naquela região, além de cobrarem a proibição para as atividades degradadoras.

O impasse

O representante do Copam, Dirceu Costa, explica que órgãos ambientais não entram em um acordo. O órgão responsável pela proteção da Mata Atlântica e das cavernas locais é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), já a entidade que pode conceder autorização para as atividades mineradoras é a Superintendência Regional de Meio Ambiente (Supram), da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad). Esses órgãos não chegam a um consenso e acabam permitindo que a situação continue e se agrave.
A reportagem do Hoje em Dia mostra que o impasse chama atenção até da Organização das Nações Unidas (ONU), além de despertar a preocupação do Grupo de Gestão de Conflitos Relacionados à Mineração (Gescom), do Ministério do Meio Ambiente e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Há confusão até mesmo no que diz respeito às duas entradas da Gruta Jardim do Éden, que foram lacradas com cadeados pelo Ibama, mas os mineradores são os guardiões das chaves. Na semana passada, a grade de ferro que barra a entrada da gruta estava sem os lacres do Ibama e presa apenas pelo nó de uma corda e dois cadeados frouxos.
Estranhamente, o superintendente do Ibama em Lavras, Adriano Garcia, informou que não tinha conhecimento dessa situação e disse que comunicaria à mineradora, para que ela conserte o cadeado. ?O Ibama não vem às reuniões do Conselho Municipal de Meio Ambiente e está a 154 quilômetros daqui, em Lavras. Aqui, ele é inoperante e não sabe o que acontece?, criticou o prefeito de Pains.
São apontados como causas da degradação das grutas a falta de cuidados, as vibrações que podem ser causadas por explosões, tráfego intenso e o vandalismo. No interior da caverna há blocos enormes pelo caminho e pelas galerias e corredores escombros e pedaços pontiagudos de rochas quebradas. Como se não bastasse, invasores deixam lixo em toda parte e marcas, desenhos, rabiscos e mensagens nas paredes da caverna.

Pains no cenário nacional

Levantamentos do Centro de Cavernas (Cecav) do IBAMA revela que mais de um quarto das grutas e cavernas de Minas Gerais está dentro do município de Pains. Segundo a última atualização, havia registro de 2.168 cavernas no Estado, sendo 564 delas em solo painense. O conselheiro do Copam, Dirceu de Oliveira Costa, conta que nas 20 áreas pretendidas por mineradoras, há cerca de 60 cavernas catalogadas.
Na reportagem do Hoje em Dia, o presidente da organização não governamental Biodiversitas e curador de Paleontologia do Museu de Ciências Naturais PUC Minas, professor Castor Cartelle, classificou a situação como alarmante. ?Pains é um desastre. As grutas ficam perto de áreas povoadas, onde o trânsito é grande, as mineradoras não deixam pesquisadores trabalharem?, criticou.

Irregularidades

O Hoje em Dia levantou junto ao Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema) que as duas mineradoras que funcionam dentro da área urbana de Pains não teriam autorização para minerar. A Mineração Saldanha Ltda teria dois processos, um para Revalidação de Licença de Operação (LO) em uma lavra antiga, vencida em 2007, e outro para aquisição de licenças de Pesquisa (LP) e de Impantação (LI) para extração de calcário em outra área. Assim, segundo o Sisema, a Saldanha não poderia explodir mais nenhuma carga ou remover uma pedra sequer do lugar no Estado desde 2007.
A Calcinação Pains Ltda teria seis processos ativos e nenhum deles permite a mineração nas lavras de sua propriedade. A única licença ativa permite a fabricação de cal e o prazo expira em pouco mais de um mês de operação. Ainda de acordo com o Sisema, técnicos da Supram informaram que ?não tinham notícia dessas atividades das mineradoras, mas que se houvesse alguma denúncia, poderiam embargá-las?.
O prefeito de Pains, Ronaldo Gonçalves (PT), ainda informou à reportagem que o abastecimento de água está no limite e sendo prejudicado pelas minerações no perímetro urbano, pois a água que abastece a cidade passa pelas cavernas.
Mineradoras chegam a pagar moradores para saírem das residências quando vão explodir as rochas, devido aos riscos que a atividade pode causar, sem contar os constantes prejuízos à população.

As mineradoras se defendem e apontam interesses políticos em jogo, alguns classificam como ?infundada? a acusação de que as explosões provoquem desabamentos nas cavernas. Os mineradores também garantem que não estão na ilegalidade e que, no caso da Mineração Saldanha, aguarda desde 2007 a finalização do processo de licenciamento e não houve, neste período, cassação do direito.Uma fonte da Calcinação Pains alega ter uma Autorização Provisória (Apo), concedida pela Supram para operar.

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