Em 394 mil domicílios mineiros, pelo menos uma pessoa pediu um empréstimo no último mês para enfrentar a pandemia, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 76 mil desses domicílios, o pedido foi negado, principalmente às famílias com renda inferior a R$ 2.000 per capita. Em todo o Brasil, foram cerca de 4 milhões de lares onde alguém precisou de um empréstimo, e aproximadamente 762 mil não conseguiram. 

É a primeira vez que o IBGE inclui a informação em uma pesquisa, por isso não é possível fazer o comparativo com anos anteriores. Dados de algumas instituições, porém, sugerem que a pandemia acentuou a procura por empréstimos em todo o Brasil. A Sim, fintech de empréstimo pessoal do Banco Santander, registrou aumento de 113% no volume de pedidos de crédito no segundo semestre deste ano, em comparação aos três primeiros meses. Os pedidos com veículos como garantia tiveram aumento ainda mais expressivo, de 288%.

Em Belo Horizonte, o endividamento das famílias permaneceu em alta nos últimos cinco meses, indicando que elas continuam a consumir mesmo durante a pandemia, conforme mostra um levantamento da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Minas Gerais (Fecomércio MG). Das pessoas endividadas, 8,8% estavam comprometidas com crédito consignado em julho — aumento de 1,1 ponto percentual em relação ao mês anterior. “O endividamento aumentar indica que as pessoas estão utilizando empréstimos, cartão de crédito, financiamento e cheque especial para conseguir arcar com compromissos financeiros. É esperado que isso aumente em tempos de crise, pois há muita oscilação de renda e pessoas perdendo emprego”, explica a economista Bárbara Guimarães, uma das responsáveis pela pesquisa.

O professor de economia e finanças da Una, Cleyton Izidoro, pontua que a taxa Selic, a taxa de juros da economia brasileira, está no patamar mais baixo da história. A princípio, isso significa juros mais baixos nos empréstimos, porém ele explica que, na prática, o cenário não está vantajoso para todos os consumidores. “Há as pessoas que já tinham empréstimos e um cadastro bom no banco, que conseguiram empréstimos com taxas menores. Há aquelas que não estavam com situação financeira boa, enroladas, e muitas delas foram reprovadas. Também há pessoas que foram aprovadas, mas pagaram taxas mais caras, pelos critérios do banco neste momento”, diz. 

Empresas oferecem empréstimo de pessoa para pessoa como opção na pandemia 

Em 2018, o Banco Central passo a autorizar que fintechs, startups do setor financeiro, atuassem como Sociedade de Empréstimo entre Pessoas. Assim, elas passaram a oferecer plataformas em que pessoas físicas fazem investimento, de um lado, e outras pessoas tomam empréstimos a partir dessa oferta, do outro. Atualmente, apenas sete empresas estão autorizadas a funcionar dessa forma no Brasil. 

Uma delas, a Mova, atua no mercado desde o primeiro semestre de 2019 e tem assistido à expansão da demanda durante a pandemia. “A média de empréstimos concedidos entre março e junho, em comparação ao janeiro e fevereiro, aumentou 2.400%, ou seja, 24 vezes”, diz Leonardo Biondo, líder de vendas e de desenvolvimento de negócios da empresa. O número contabiliza empréstimos para pessoas físicas e jurídicas — a plataforma também permite que empresas tomem empréstimo. 

“A maior parte de quem pediu empréstimo foi na linha de crédito emergencial que fizemos na pandemia, de R$ 1.000 a R$ 5.000, e são pessoas das classes B, C e D. A primeira demanda é por consolidação de crédito, isto é, tomar uma dívida mais barata conosco para pagar uma dívida mais cara em outra instituição. A segunda é para custear despesas médicas”, completa Biondo. 

Uma das clientes de Minas Gerais foi uma analista de sistemas de 23 anos, que prefere não se identificar. Com o salário reduzido pela metade durante a pandemia, ela tomou um empréstimo de R$ 1.000, dividido em 24 vezes, para pagar uma certificação na sua área. “Se não fosse a pandemia, acho que eu não precisaria do empréstimo”, conta. 

Estreante no mercado, a Upp iniciou as operações em janeiro deste ano e já sente os impactos da pandemia, de acordo com Gabriel Pérgola, CEO e fundador da empresa: “Como toda empresa com base tecnológica, o crescimento é mais acelerado. Mas normalizando isso e considerando a pandemia, o aumento dos pedidos de empréstimo foi da ordem de 20%”.

Os empréstimos são a partir de R$ 1.000, e Pérgola conta que pessoas com renda mais baixa eventualmente encontram dificuldade para obter valores mais elevados. “Muitas vezes, é uma turma mais informal. A pessoa diz que está empregada, mas, quando pedimos holerite ou notas fiscais, não têm. Nesses casos, a gente acaba aprovando um valor menor de empréstimo do que gostaria, no primeiro momento”, diz. 

Para especialistas, momento é de planejamento e pé no chão

O professor de economia e finanças Cleyton Izidoro reforça que a incerteza trazida pela pandemia obriga as pessoas a planejarem mais de perto a vida financeira. “Esse cenário muda tudo. É preciso manter os gastos no mínimo possível e evitar os necessários. Em momentos de crise, o planejamento financeiro é para não perder, enquanto em outros momentos é para adquirir. Vejo pessoas falando que é hora de fazer dívidas, mas é hora de planejamento com pé no chão. Quem for pegar empréstimo pessoal tem que garantir pelo menos 12 meses de pagamento”, elabora. 

Bárbara Guimarães, economista da Fecomércio, lembra uma regra básica para a busca por um empréstimo: a comparação entre as opções oferecidas. “É preciso comparar as taxas de juros de várias instituições financeiras e pesar qual vai comprometer menos sua renda futura. Neste momento de incerteza, é importante discriminar toda a sua renda e saber qual parte dela está comprometida no futuro e quanto dela você pode gastar”, diz. 

Fonte: O Tempo Online

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