Detentos do estado de Minas Gerais soltaram a voz na tarde desta sexta-feira (20) no ?IV Festival de Música do Sistema Penitenciário? (IV Festipen), realizado no Auditório da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese), no bairro Nova Gameleira, Região Oeste de Belo Horizonte.
O grande vencedor foi Moisés Araújo Cristiano, 29 anos, que está preso na Penitenciária Dênio Moreira de Carvalho, em Ibapa, na Região do Vale do Rio Doce, a 300 quilômetros da capital mineira.
A canção escolhida pelos jurados foi ?Voa passarinho?. ?Quero passar para a juventude uma nova visão, para que eles não caiam nesta situação?, disse ele, referindo-se à vida de detento que leva há oito anos. A pena dele foi de 14 anos por tráfico de drogas e furto. Por vencer o ?IV Festipen?, ele ganhou um violão.
O segundo lugar ficou com Priscila de Souza Rocha com a música ?Só falta você?. Ela ganhou um cavaquinho. Na terceira colocação, Leonardo de Amorim Andrade levou um pandeiro com a música ?A libertação?.
Quatorze finalistas concorreram ao prêmio de melhor música composta dentro de uma prisão e lançaram o CD ?Vozes das Celas?. Participaram da seleção todas as unidades prisionais do estado, com mais de 500 músicas inscritas no concurso.
Para o superintendente de Atendimento ao Preso, Guilherme Augusto de Faria Soares, ?o Festipen é uma maneira de mostrar que as grades não são um limite físico dos valores humanos, de talentos e de inspiração?.
Soares acredita que todo o indivíduo pode desenvolver talentos, mesmo que ele esteja preso. ?Os detentos fazem uma transposição das angústias, expõem sentimentos em forma de música?, finalizou.
O secretário estadual de Defesa Social, Lafayette Andrada, disse que ?todo o esforço de humanização dentro do sistema prisional é muito difícil, mas a música e a emoção brotam da alma?.
E ressaltou que ?a música é um instrumento que Deus criou para alegrar a alma […] Eles [os detentos] precisam utilizar a reflexão para verem o que estão vivendo hoje e que poderão viver amanhã, para projetar um futuro melhor?, destacou Andrada.
Outros participantes
O presidiário Miller de Oliveira Silva, 26 anos, da Penitenciária João Pimenta da Veiga, em Uberlândia, na Região do Triângulo, viajou 550 quilômetros para participar do festival com uma música em ritmo de pagode.
Ele foi condenado a 16 anos por furto e roubo e já cumpriu seis anos. ?Compus a música ?Acabou, virei o jogo?. É a história de um homem que dispensou a mulher porque ela só queria farra, prazer e não ligava para o amor?, explicou Silva.
Cleiton Schmidt, 38 anos, está no Presídio de Andradas, na Região Sul de Minas Gerais, e foi condenado por tráfico de drogas. A pena foi de 18 anos e ele está recolhido há três. ?Criei a música em um momento que eu estava pensando na dificuldade da vida. Deus me fortaleceu com essa composição?, disse Schmidt. A canção dele é ?O sonho não acabou?.
Já dona Maria Aparecida da Silva, 70 anos, que mora no bairro Taquaril, Região Leste de Belo Horizonte, foi prestigiar o neto, que está em liberdade condicional desde a última sexta-feira (13). ?Vejo o festival como uma coisa boa porque tira as coisas ruins da cabeça deles. Meu neto está entusiasmado, principalmente por causa da condicional que ele recebeu?, falou dona Maria Aparecida. Claudinei Roque da Silva, 28 anos, foi condenado por roubo e ficou preso no Centro de Remanejamento Prisional de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, por dois anos. A música que ele compôs foi ?Presente de Deus?.
A irmã dele, Gisele da Conceição Gregório, 26 anos, também apoiou a iniciativa. ?Era tudo que eu queria para ver o meu irmão tocar a vida. Agora é bola pra frente para ele seguir a carreira, porque ele sempre gostou disso?, contou Gisele.
O júri foi composto pelos músicos Gilberto Junqueira e Reginaldo da Costa e pela vocalista da banda Dolores 602, Daniela Ventura. Todos os finalistas ganharam uma medalha e um kit com 50 CDs.
A tarde artística ainda contou com a participação do grupo teatral ?Vida Nova?, composto por detentos, que apresentou a peça em que conta a história do delegado Estadeu Costa, idealizador do Festipen.
O projeto
O Festipen é uma iniciativa da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) e tem por objetivo incentivar e revelar talentos musicais dentro das penitenciárias e promover a humanização do sistema prisional em Minas.
A experiência demonstrou que a música tem melhorado o comportamento dos detentos, facilitando a convivência com outros internos e as relações com os funcionários dos presídios onde o festival é realizado.
Este foi o lançamento do quarto CD ?Vozes das Celas? com a participação de várias unidades prisionais. O primeiro foi lançado em 2006, o segundo em 2007 e, o terceiro, em 2009. O projeto é promovido pela Seds, com patrocínio da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e da Secretaria de Estado de Cultura (SEC), e apoio do Ministério da Cultura (MinC).
?O idealizador do projeto, Estadeu da Costa, morreu em 20 de maio de 2010. Por isso, o IV Festipen foi realizado hoje para homenageá-lo?, disse a advogada Ana Paula Bertolini Costa, filha de Costa. Ela falou, ainda, que continuará no desenvolvimento do projeto criado pelo pai.

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