O número de escândalos e absurdos envolvendo o Ministério da Agricultura só aumenta e nos assusta.

Não bastasse as ocorrências detectadas na Operação “Carne Franca”, deflagrada pela Polícia Federal, em março de 2017, quando vieram a público um esquema de corrupção e liberação irregular de licenças em cerca de 20 frigoríficos, sob a acusação de que vendiam carne estragada, faziam uso de carne proibida em lotes de linguiça, comercializavam produtos fora da validade, usavam produtos químicos para atenuar o odor da carne, injetavam água na carne para aumentar o peso, trocavam as etiquetas das datas de validade dos produtos.

Todas essas irregularidades contra os direitos dos consumidores ocorreram por diversas razões, principalmente pela existência da vigilância agropecuária na mesma estrutura hierárquica do Ministério da Agricultura, instituição pública responsável pela “gestão das políticas públicas de estímulo à agropecuária, pelo fomento do agronegócio e pela regulação e normatização de serviços vinculados ao setor”. Quer dizer, os interesses são conflitantes, pois o Ministério da Agricultura ao ser severo na vigilância da produção agropecuária no interesse público de todos os consumidores geraria custos adicionais para a produção.

Além disso, estando a vigilância agropecuária sob a estrutura do Ministério da Agricultura é possível controlar as ações dos fiscais, fazer atividades de fiscalização de modo formal e, caso ocorram algumas anormalidades, como as detectadas na “Operação Carne Fraca”, as autoridades têm o discurso para o público interno e externo da existência de um amplo setor de fiscalização do Ministério, composto por milhares de fiscais. Ao final, o setor de fiscalização pode até atuar de modo efetivo muitas vezes, mas, infelizmente, mostrou-se em muitas ocasiões ser meramente formal, diante do número de ocorrências detectadas.

Agora, no dia 9 de novembro, a Polícia Federal deflagrou nova operação, denominada de “Operação Capitu”, um desdobramento da Lava-Jato, com o cumprimento de 63 mandados de busca e apreensão e 19 de prisão temporária, todos expedidos pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

Durante as apurações, empresários e funcionários investigados atuaram para obstruir as investigações, prejudicando a instrução criminal, com o objetivo de desviar o foco de apuração, daí o nome da operação “Capitu”, personagem dissimulada da obra “Dom Casmurro”, de Machado de Assis.

A JBS, empresa do grupo J&F, dependia de normatizações e licenciamentos e teria passado a pagar propina a funcionários do alto escalão do Ministério da Agricultura em troca de atos de ofício, para eliminar a concorrência e entraves às suas atividades, facilitando a constituição de um monopólio do mercado. Entre os atos de ofício praticados destacam-se a expedição de atos normativos, determinando a regulamentação da exportação de despojos; a proibição do uso da ivermectina de longa duração; e a federalização das inspeções de frigoríficos.

Essas práticas são uma afronta à livre concorrência e desobedecem preceitos legais contidos na Lei nº 12.529, de 2011, especificamente o artigo 36 que prevê serem infração da ordem econômica os atos limitadores da livre concorrência e da livre iniciativa, bem como exercer de forma abusiva posição dominante no mercado. Já o artigo 37 prevê que as multas podem variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado.

A prática acima produz o fortalecimento do grande produtor e também acarreta a fragilização do pequeno produtor rural, o qual tem uma importância social significativa ao gerar a maior parte dos empregos no meio rural, manter o homem rural no campo, produzir alimentos para o mercado interno e conseguem manter em suas propriedades uma maior diversidade do meio-ambiente. Por outro lado, o grande produtor rural é o responsável pela grande produção de produtos exportáveis, como soja, milho, etc., exerce uma monocultura altamente mecanizada e com pouco uso de mão-de-obra, faz uso intensivo da terra e elimina toda a biodiversidade do meio-ambiente.

Além das operações referidas acima, após os resultados eleitorais do segundo turno das eleições presidenciais, no dia 28 de outubro, com a eleição de Jair Bolsonaro para presidente da República, começaram as discussões sobre a diminuição no número de ministérios, fusão, extinção e, neste contexto, cogitou-se da união dos Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente.

O Ministério da Agricultura geralmente tem como ministro titular uma pessoa ligada à bancada rural, para defender os interesses diversos do setor, principalmente negociais e financeiros.

Agora, a união do Ministério da Agricultura com o Meio Ambiente geraria a submissão da pasta de Meio Ambiente aos interesses comerciais do agronegócio, seria uma integração meramente formal, onde o que prepondera sempre é o interesse financeiro.

Na eventual união dos ministérios, o meio ambiente será prejudicado. Tem uma propaganda sobre o agronegócio mostrando diversos produtos do agronegócio, com os slogans, por exemplo, “abelha é agro”, “peixe é agro”, passar-se-ia a ser entendido que “meio-ambiente é agro”. Não podemos aceitar tamanha sujeição do meio-ambiente aos interesses comerciais.

A futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina, deputada federal do DEM, indicada pela bancada rural, afirmou que a fusão com o meio-ambiente traria mais ônus do que bônus, pois poderia acarretar barreiras comerciais aos produtos brasileiros.

Após tudo, podemos afirmar que o interesse único do Ministério da Agricultura é aumentar o faturamento das grandes empresas do agronegócio, mesmo com prejuízos para os consumidores, o pequeno produtor rural e o meio-ambiente.

Uma das formas do consumidor se proteger é fortalecer os pequenos produtores locais ao adquirir produtos agrícolas nas feiras locais de sua cidade, consumindo frutas, verduras, ovos e carnes produzidas nas adjacências, as quais geralmente são de boa qualidade e sem o uso de agrotóxicos.

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