Desespero, incerteza, medo e a perspectiva de grandes prejuízos. Esses têm sido sentimentos constantes na vida de muitas famílias, inclusive na de Daniel Luiz Silva, que em outubro de 2014 recebeu, da Prefeitura de Formiga, a doação de um lote localizado no residencial Vista Alegre, na expectativa de que ali, ergueria sua casa própria. 

Este era o grande sonho da vida dele, assim como de muitos outros “ganhadores” que igualmente acreditaram que o “presente” recebido do município, nesta e em outras administrações, com ou sem a intervenção ou ajuda de políticos, era algo de concreto, que se transformaria em patrimônio da família. 

Sair do aluguel ou deixar de morar de favor se transferindo para a casa própria, era a maior motivação de todos os “beneficiados”.

O caso em pauta, o da família de Daniel, casado há 11 anos e pai de duas filhas, de 9 e 10 anos de idade, pedreiro que morava há um bom tempo de favor na casa de sua  mãe, também não se difere muito da regra acima mencionada.

A doação recebida, que deveria ser o início de um tempo melhor para a família, hoje tem trazido muita angústia a todos: “Fui até a Prefeitura, pedi e me deram o lote, com todos os documentos de liberação para construir, o que eu tinha que fazer em seis meses, segundo me avisaram. Vendi tudo que eu tinha, até os móveis, para pagar o material de construção da casa que foi erguida por mim e minha esposa Liliane e ainda devo muito dinheiro em casas de material de construção. Só quando precisei de um documento para pedir que a Cemig ligasse a energia na minha casa, foi que me avisaram que o lote está numa tal de área institucional e que a Prefeitura nem poderia ter me dado o terreno”, contou Daniel.

Na terça-feira (9), à convite do pedreiro, uma equipe de redação do jornal esteve no residencial Vista Alegre, especificamente no prolongamento da rua Luís Antônio Ribeiro, onde está o terreno que lhe foi doado pela administração municipal. 

Logo na chegada, foram identificadas várias outras construções, algumas em fase inicial outras em estado mais adiantado, todas na mesma área institucional, que segundo planta apresentada pelo pedreiro, foi dividida em pequenos lotes, a grande maioria com a ligação de água feita pelo Saae, com hidrômetros devidamente instalados, o que indica que o município, por meio de seus diversos órgãos (Ambiental, Habitação, Saae e outros) – reconhece como legítimas as ocupações que segundo alguns “proprietários” entrevistados, foram fruto de doações.  

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As casas ali erguidas e em alguns casos, apenas construções inacabadas, ficam no pé de uma encosta que, segundo informação de moradores, às vezes cede, em caso de chuva mais forte, provocando a descida desordenada de muita água e terra. “Na última chuva que caiu de madrugada desceu muita água e lama e tive que tirar da entrada da casa com uma pá, pra evitar que invadisse a sala”, comentou o pedreiro, cuja construção está mais próxima do barranco (morro).

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Na minúscula casa de três cômodos e um banheiro, que ainda não foi rebocada por fora e por dentro também está inacabada, durante a visita do jornal, uma das filhas do casal fazia a lição de casa sentada no chão, amparando a folha em que escrevia, sobre o assento de um carcomido sofá. No único quarto da casa, os pais dormem no colchão sobre o chão batido, para que as filhas tenham pelo menos o conforto de um arremedo de beliche.

Apesar da dificuldade para se guardar roupas, sapatos e louças sem ter móveis suficientes, em um canto exclusivo da casa, Luiz guarda toda a documentação fornecida pela Secretaria de Planejamento e Regulação Urbana, que comprova a autorização para construir no terreno. “Tenho tudo aqui, até a guia que paguei para ligarem a água. Mas a energia ainda não consegui por causa de um documento que agora, não querem me fornecer na Prefeitura”.

Desde que o Ministério Público voltou a recomendar à Prefeitura, no dia 27 de maio deste ano, que revogue a autorização de construção em lotes doados em desacordo com a lei, incluindo as áreas institucionais de residenciais, que deveriam se prestar para a construção, ainda que futuras, de praças, igrejas, escolas, postos de saúde etc, Daniel e a família estão vivendo momentos de muita incerteza e apreensão: “Tenho medo até de sair de casa. Na Prefeitura me falaram que o Ministério Público vai mandar demolir a minha casa que construí com tanto suor. Já gastei cerca de R$40 mil e ainda tenho que fazer um muro na parte de traz para evitar que a gente morra soterrado aqui dentro”, desabafou.

Mesmo com a casa inacabada, sem energia elétrica e no local de risco em que se encontra, o imóvel é a realização de um antigo sonho da família, que apesar de realizado (em partes), agora, por incompetência, desconhecimento total das leis ou simplesmente por irresponsabilidade da administração pública, se tornou um pesadelo.

A área do imóvel não foi desafetada e assim sendo, o pedreiro, neste caso e muitos outros “ganhadores de terrenos públicos”, igualmente, não tem expectativa de receberem as respectivas escrituras, já que a recomendação do Ministério Público se estendeu à Câmara que não deve aprovar nenhum projeto de doação de lotes em área irregular. 

Porém, durante sua visita à reunião do Legislativo na segunda-feira (8), Luiz e a esposa Liliane, foram acalmados pelos vereadores Zezinho Gaiola e Cabo Cunha, que disseram não acreditar que o MP decida pela demolição do imóvel. “O Ministério Público trabalha em defesa da dignidade humana. Não houve má fé por parte de quem recebeu a doação. Creio que se, de fato a casa tiver que ser demolida, antes disso a família terá que ser reparada pelo dano causado pela administração”, disse o vereador Cabo Cunha que logo após teve sua fala endossada pelo líder do Prefeito, vereador Zezinho Gaiola. 

 

Redação do Jornal Nova Imprensa

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