O fim das ondas curtas! Será? Não! Estão renascendo e digitalizadas!

Quando foi a última vez que você ouviu uma transmissão de rádio em ondas curtas? E porque você deveria suportar possíveis ruídos no áudio e alguma interferência, quando agora temos internet?…
Isso vale se você estiver em Londres, Boston, Paris ou Toronto.
Mas e se você estiver em uma ilha na Indonésia ou se encontrar no Oeste da China, na Caxemira ou na Amazônia Brasileira? Porque, gostemos ou não, existem vários lugares remotos neste vasto mundo, muitos dos quais ainda dependem da transmissão por ondas curtas.

No passado (pense na Guerra Fria), muitas pessoas conseguiam obter informações gratuitas dos programas internacionais, por meio de transmissão em ondas curtas. Muitas emissoras internacionais operavam transmissores caros e que consumiam enorme quantidade de energia para esta faixa de frequências “sem fronteiras”, que variam de 1,7 a 30 MHz (176,3 a 10,0 m), a partir da extremidade alta da faixa de frequência média, logo acima da faixa de transmissão de onda média (OM), até o final da banda HF.

Ondas curtas é apenas um milagre, na verdade. Por ser irradiado em ângulo, atinge a ionosfera, “um espelho ao redor da Terra e depois cai como uma bola” a grandes distâncias, além do horizonte. Assim, essas transmissões alcançam os ouvintes em grandes áreas, continentes e além… Dois ou três transmissores de alta potência podem, teoricamente, cobrir potencialmente o mundo inteiro.
As ondas curtas são usadas não apenas por estações de rádio internacionais ou radioamadores, mas também são essenciais para fins de aviação, marítimos, diplomáticos e de emergência. Os sinais de ondas curtas não são restritos ou controlados pelos países receptores e, conforme as frequências mudam no inverno e no verão, elas precisam ser coordenadas internacionalmente.

Essa é uma tarefa da Conferência de Coordenação de Alta Frequência (HFCC na sigla em inglês), uma associação não governamental, sem fins lucrativos e um membro do setor da União Internacional de Telecomunicações (UIT).

Este grupo se reúne duas vezes por ano para elaborar uma programação coordenada para o verão e o inverno, solucionando problemas de interferência entre países ou emissoras. Em uma dessas reuniões recentemente foi discutido – mais uma vez – o futuro das ondas curtas.

Ninguém pode negar que as ondas curtas vão além das barreiras geográficas, culturais, religiosas, políticas, “são gratuitas” e podem ser consumidas anonimamente, apesar do inconveniente de que não é possível qualquer um produzir material igual na internet. Há cerca de 20 anos, a BBC decidiu cortar suas transmissões de ondas curtas para países como os Estados Unidos e outras partes desenvolvidas do mundo, já que esses territórios, ou melhor, “mercados” eram atendidos pelas rádios comerciais em FM e pela internet, etc. Outras importantes emissoras internacionais, incluindo Deutsche Welle, Rádio Austrália e Rádio Exterior de Espanha logo copiaram esse modelo.

Mas a BBC manteve ondas curtas para seus grandes públicos na África e parte da Ásia. No momento, as principais emissoras de ondas curtas são BBC, Voice of América, All Índia Radio, China Radio International, Rádio Japan, Radio Romênia, KBS Korea, Voz da Turquia, dentre outras.

Vinte anos após o primeiro grande golpe nas ondas curtas, essa faixa de frequência e seu potencial estão sendo revisitados. Afinal, nem todos os ouvintes do mundo têm banda larga, smartphones, planos de dados, carros conectados ou renda disponível suficiente. E o rádio analógico em geral continua a ser resiliente: um terço das residências no Reino Unido não possui rádio digital (a penetração do DAB [Digital Audio Broadcasting] atingiu 64%). Isso ocorre 25 anos após o início das primeiras transmissões DAB em Londres em 1993) e 20 anos após a participação dos players comerciais.

As ondas curtas foram colocadas na agenda novamente, pois alguns dos antigos transmissores precisavam ser substituídos ou atualizados. Enquanto isso, tornaram-se digitais e isso significa transmissores mais eficientes e economia significativa de energia de até 80% em comparação com os antigos transmissores analógicos. Não é de admirar que a maioria dos transmissores analógicos de ondas curtas vendidos hoje sejam compatíveis com o DRM (Digital Radio Modiale) – (ondas curtas digitais).

Em 2020, a BBC ainda possuía transmissores em ondas curtas e tendo um grande público em países como a Nigéria, tendo introduzido recentemente novas transmissões de ondas curtas em outros idiomas.

Recentemente, na Austrália, houve uma ampla consulta sobre a possível reintrodução de ondas curtas para muitas ilhas do Pacífico, dependendo dos serviços das emissoras australianas, que se apressaram em fechar boas instalações de ondas curtas na busca pela internet e pelo rádio digital local.

A Rádio Exterior de España dobrou suas transmissões desde outubro, acrescentando outros idiomas além do espanhol à sua programação. A Rádio Moscou, a ferramenta de propaganda contundente da Guerra Fria, foi transformada na elegante Rádio Sputnik. E a Rádio China atualizou silenciosamente alguns de seus muitos transmissores de ondas curtas para uso doméstico e agora cobre praticamente todo o país com sinais de ondas curtas digitais (DRM).

O rádio digital foi originalmente inventado para amplitude modulada (AM) e grande cobertura (IC) e as vantagens da boa qualidade de áudio e multimídia extras de serviços que podem levar de vez as ondas curtas na direção deste século. Talvez o DRM estivesse à frente de seu tempo, quando lançado, em 2003, pela UIT (recomendação ITU-R BS 1514) e recomendado por esse organismo como único padrão mundial nas bandas entre 3 e 30 MHz. A introdução gradual de transmissões digitais internacionalmente não ocorreu como se esperava – em conjunto com a produção e venda de receptores, que continua sendo um negócio regional e nacional.

Desde o nascimento, o DRM provou que é uma opção adequada para ondas curtas, oferecendo uma boa qualidade digital de áudio e até mesmo vídeos ao vivo curtos a grande distância, isso mesmo, vídeo via ondas curtas, algo que, nas ondas curtas analógica era proibido por usar muito espaço (banda) a não ser que se pedisse uma autorização especial ou usada como pacote de dados o que ocorre naturalmente no sistema digital, via dados.
Agora, finalmente, existem receptores DRM capazes de receber ondas curtas, há transmissões e emissoras interessadas. Tranquila e seguramente as ondas curtas estão sendo reexaminadas e apreciadas pela qualidade das transmissões e por seu potencial como “rádio de crise” também. Pode se tornar crucial em emergências quando estações de rádio locais e regionais, satélite e internet podem estar fora do ar devido a danos.
A era de ouro da transmissão analógica de ondas curtas provavelmente terminou. No entanto, a banda tem um papel importante e um grande potencial. Ela precisa ser apreciada e examinada com uma mente aberta, pois agora parece existir um verdadeiro alinhamento de interesses nacionais, possibilidades técnicas e disponibilidade de receptores, o que poderia dar às ondas curtas uma nova oportunidade de vida como uma plataforma viável e única.

Brasília – Parque do Rodeador, complexo de transmissão em ondas curtas da Rádio Nacional da Amazônia, Foto Joédson Alves/Agência Brasil

Foto: Fábio Giacomelli, EBC, Internet.

Rádio Ocean Digital, arquivo pessoal do autor.

Rádio Ocean Digital, arquivo pessoal do autor.

 

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