O crescimento da economia brasileira está transformando a região do Lago de Furnas, no Centro-Oeste de Minas Gerais, no paraíso dos endinheirados. Incorporadoras de todo o Brasil investem mais de meio bilhão de reais na construção de loteamentos e complexos turísticos de alto padrão nos 34 municípios banhados pelo lago. Para atender ao alto padrão de exigência dos investidores, os empreendimentos contam com pistas de pouso, campo de golfe, heliponto e marinas com capacidade para abrigar vários barcos. A estratégia das empresas do ramo é disputar um mercado restrito, mas muito rentável.
Os empreendimentos são considerados um ótimo negócio para as construtoras, mas também para os próprios compradores, que podem engordar seu patrimônio em até 300%, índice de valorização dos terrenos nos dois últimos anos. ?Os preços dos terrenos aqui estão quatro vezes mais altos do que em 2009. Quem investe tem lucro certo?, diz o presidente da Associação dos Municípios do Lago de Furnas (Alago) e prefeito de Guapé, Nelson Lara.
Diante da demanda aquecida no setor imobiliário, quatro loteamentos foram lançados em 2010, em Capitólio, cidade com pouco mais de 8 mil habitantes e que fica às margens do lago criado pela represa de Furnas. Com 1.440 quilômetros quadrados, o lago, chamado pelos moradores da região de ?Mar de Minas?, tem quatro vezes a capacidade da Baía da Guanabara. Os últimos lançamentos imobiliários na cidade remontavam à década de 90. ?Estamos todos animados com esta movimentação. É geração de emprego e desenvolvimento para nossa região?, afirma o prefeito de Capitólio, José Gonçalves Machado.
A Alago estima que cerca de 2 mil postos de trabalho sejam criados com a movimentação imobiliária na região de Furnas, principalmente na construção civil e nos serviços.
Neste frenesi imobiliário, a cidade de Guapé não ficou de fora. Foi uma península de mais de 1,8 milhão de metros quadrados na parte da represa que banha o município que encantou a família Carbonari, os donos da Anhanguera Educacional.
Eles compraram metade do terreno que pertencia ao empreendedor local, Jayme Resende, de quem acabaram se tornando parceiros. A parceria deu origem à empresa Porto Rezende, que vai gerir o empreendimento.
Somente na primeira etapa, o projeto contará com um aporte de R$ 45 milhões para obras de infraestrutura e montagem do centro náutico, clube equestre e aeroclube. Na segunda fase, mais R$ 40 milhões devem ser investidos no projeto.
Também faz parte do empreendimento a criação de um spa, que terá bandeira de uma rede hoteleira internacional ainda não definida pela família Carbonari. ?A área total do empreendimento será de 22 mil metros quadrados, com 6.700 metros quadrados de área construída. Também teremos 121 vagas para barcos de até 26 pés e 121 vagas para barcos de até 37 pés?, afirma Antonio Carbonari Neto, sócio do projeto e fundador da Anhanguera.
De olho nas oportunidades na região, a maior empresa loteadora de Minas Gerais, o grupo Vitória da União, não perdeu tempo e aportou no Lago de Furnas com o Vitória Náutico Residence, empreendimento com 700 mil metros quadrados de área total e 856 lotes. Sem fazer lançamento e divulgação do condomínio, 50% dos lotes já foram vendidos.
?É retorno certo. Injetamos R$ 20 milhões no projeto e esperamos recuperar este investimento com um lucro de 200%, cerca de R$ 80 milhões em um ano, revela o gerente comercial da Vitória da União, Guilherme Matos Utsch. O projeto do grupo também conta com heliponto e um complexo de marina.
Avião na garagem de casa
Boa parte dos condomínios de luxo do Lago de Furnas conta com aeroportos particulares, construídos para garantir comodidade e privacidade aos moradores e visitantes. É o caso do Quintas Ponta do Sol, de Régis Campos, dono da construtora Emccamp, referência na construção de casas para a classe C. O empresário não poupou esforços para construir uma pista de pouso que chega até cada um dos terrenos. ?É um conceito conhecido como fly in. O dono tem o privilégio de estacionar o avião em casa,? afirma.
O empresário afirma que outro atributo que confere exclusividade ao projeto é que todos os terrenos têm marinas. Assim, além de poder estacionar os aviões, os proprietários das mansões também podem atracar seus barcos no quintal de casa.
Campos revela que, dos 20 lotes de 10 mil metros quadrados cada, apenas dois ainda não foram vendidos. ?Vendi todos apenas para os amigos?, diz.
O empresário detalha que investiu cerca de R$ 20 milhões no empreendimento, incluindo o asfaltamento dos seis quilômetros do trevo que liga Capitólio ao bairro Escarpas do Lago. ?Já recuperei esse montante com a venda dos imóveis, mas meu objetivo principal não era lucrar com esse condomínio, era transformar o local em reduto de tranquilidade e de privacidade para mim e meu amigos?, diz Campos.
Outro projeto criado a partir da perspectiva da exclusividade é o Península Escarpas. Com 76 lotes, o projeto foi criado por um grupo de nove amigos e encabeçado por Samur Junqueira Oliveira, proprietário de uma rede de concessionárias de veículos em Belo Horizonte. ?Inicialmente, queríamos nos reunir em Furnas durante os feriados, mas com o tempo percebemos que poderia ser um bom investimento, por isso expandimos o projeto?, conta Oliveira.
Hotéis de luxo e estaleiro no interior
Além de condomínios de luxo, a região do Lago de Furnas atrai complexos hoteleiros sofisticados. A presença de turistas que têm poder de compra fomentou inclusive o desenvolvimento de um estaleiro que produz 800 embarcações por ano em pleno interior de Minas.
O hotel Furnas Park, localizado à beira do reservatório, na cidade de Formiga, entra na lista de estabelecimentos sofisticados. Trata-se do primeiro na região a manter uma pista de pouso exclusiva para os hóspedes. ?Se o nosso cliente quiser, ele pode vir para o hotel com seu próprio avião. Hoje, o nosso aeroporto tem capacidade para manter estacionados 45 aviões de uma só vez?, revela Paulo Alves, proprietário do Furnas Park .
Nascido em Formiga, Alves é empresário do setor automotivo na cidade de São Bernardo do Campo (SP), mas percebeu que a região tinha potencial para receber um hotel voltado para atender o turista sofisticado. Com capacidade para 108 hóspedes nos 49 apartamentos e dez chalés, o preço da diária varia entre R$ 450 e R$ 1.800.
Para os turistas que viajam a lazer e em família, as opções de recreação para os filhos são fatores de peso na hora de escolher o hotel e o destino, avalia Alves. ?Por isso, temos toda a infraestrutura voltada para que o hóspede, de qualquer idade, possa fazer qualquer atividade que desejar, como rapel, trekking, passeios de lancha ou apenas descansar à beira da piscina?, diz.
Alves revela que, desde que foi inaugurado, no ano passado, o faturamento médio mensal do resort é de R$ 1,5 milhão por mês. ?Tenho certeza de que, em cinco anos, vamos recuperar os investimentos que fizemos para que a região do lago tivesse um hotel à altura do turista que tem aportado por aqui?, diz.
MPF investiga impacto ambiental
Os investimentos no entorno do Lago de Furnas animam os governos locais, mas esbarram em questões ambientais que estão colocando em alerta o Ministério Público Federal (MPF) na cidade de Passos. De acordo com a procuradora da República Ludimila Oliveira, dez empreendimentos na região dos municípios banhados pelo lago estão sob investigação do MPF, que pretende apurar se há irregularidades nas suas implantações.
Na maioria dos casos, a procuradoria não concorda com a localização dos empreendimentos, que ficam muito próximos à margem do lago ou construídos em área de preservação ambiental. ?O entorno dos reservatórios artificiais é considerado área de preservação permanente, onde é proibido o parcelamento do solo?, argumenta Ludimila.
De acordo com a procuradora, o Código Florestal brasileiro considera área de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação situadas ao redor dos lagos e reservatórios d?água naturais ou artificiais, como é o caso de Furnas. Dessa meneira, fica proibido construir a menos de cem metros de distância do lago. ?Temos empreendedores anunciando construções que ficam a menos de 50 metros da água?, diz Ludimila.
Produção de barco emprega 85
Em um cenário propício para o esporte e lazer náuticos, não demorou muito para que a cidade de Capitólio atraísse um dos principais estaleiros do país, a fábrica de barcos Ventura, que tem sede no município e uma filial em Manaus.
O Ventura é o único estaleiro de Minas Gerais. De acordo com o diretor Comercial da empresa, Marco Garcia, a fabricação média por ano é de cerca de 800 embarcações de 17,5 pés a 30 pés. ?É um setor rentável, e temos fabricado e vendido bastante?, diz.
A empresa emprega 85 pessoas diretamente e gera mais 160 empregos indiretos. Segundo Garcia, para agradar a um público seleto, luxo e tecnologia são fundamentais. Uma embarcação de 17,5 pés pode custar R$ 36 mil, e uma maior e mais luxuosa, até R$ 1,8 milhão.
Garcia diz que o estaleiro está em Minas desde 2003. Nessa época, eram vendidos, em média, 50 barcos por ano. De lá para cá, com o aumento do poder aquisitivo da população brasileira e com a classe A gastando ainda mais, o setor não parou de crescer. ?Enquanto se fala que alguns setores da economia crescem 6% a 9% ao ano, no nosso ramo não falamos em crescimento menor do que 20%?, garante.
Boa parte da produção do estaleiro é lançada nas águas do Lago de Furnas. ?Somente os clientes de São Paulo compram mais barcos do que os mineiros?, diz Garcia. A previsão da empresa é aumentar a produção para mil barcos por ano, com a previsão de lançamento do V410 Premium, de 41 pés, com fly-bridge (posto de comando no exterior da embarcação), que será lançado ainda em 2011. ?Queremos com isso conquistar um tipo de cliente que não mede esforços para ter o que há de melhor que o dinheiro pode comprar?.
Condomínio foi multado
No início deste ano, a Justiça Federal em Passos suspendeu a comercialização das unidades imobiliárias do condomínio Marinas Portobello, que ficam a menos de cem metros do nível máximo de cheias do Lago de Furnas.
A multa foi fixada em R$ 390 mil por unidade vendida. Além desse impedimento, segundo o MPF, o terreno ainda está inserido no bioma Mata Atlântica, área de preservação ecológica protegida por legislação federal específica que proíbe expressamente o parcelamento do solo. A construtora Medina, responsável pelo empreendimento, diz que possui licenças ambientais estaduais e do Ibama.
?Não somos contra os empreendimentos. É preciso que o desenvolvimento venha, mas com respeito e observância às leis ambientais?, diz a procuradora Ludmila Oliveira. Para ela, as prefeituras precisam ser mais criteriosas na hora de conceder as licenças e devem também solicitar o estudo de impacto de vizinhança. ?A população do entorno do lago tem crescido muito com a implantação destes condomínios e este estudo deve ser exigido dos empreendedores?, diz.

COMPARTILHAR:

Receba as publicações do Últimas Notícias em primeira mão no nosso grupo do WhatsApp:
https://chat.whatsapp.com/DoD79bcrBLZIqK6nRN2ZeA