No final do ano de 2014, após alguns meses de trabalho junto a Câmara e representantes da sociedade, inclusive com a realização de audiências públicas, o município conseguiu junto ao Legislativo a aprovação da Lei 4983 ? 8/12/2014, modificando substancialmente a forma de cobrança da Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública (CIP ).
Para tanto, contou com o apoio de representantes da Cemig, para cumprir determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que através de resolução, transferia aos municípios a responsabilidade pela execução de tais serviços.
A lei apresentada pelo Executivo e aprovada (de afogadilho) pela Câmara, continha erros crassos que, mais tarde reconhecidos como tal, resultaram no Projeto de Lei 329/2015, já tramitando na Câmara e que pretende alterar a redação da lei aprovada, no intuito de sanar parte dos vícios nela contidos.
No entanto, no entender de muitos e inclusive do tributarista Euler Vespúcio, autor de extenso e bem fundamentado parecer, a lei em questão ainda extrapola ou não atende aos limites legais definidos, inclusive pela Constituição Federal; desconhece o princípio da isonomia, além do fato de que a contribuição para o custeio de iluminação pública tem caráter universal e não é divisível, princípio basilar que também nela não se observou.
Em seu parecer, Euler reafirma que a CIP tem como finalidade a arrecadação de recursos para arcar com os custos da iluminação de logradouros públicos, não podendo ser usada para a quitação de débitos referentes a consumo de energia elétrica destinada a prédios públicos (Prefeitura, escolas, postos de saúde, repartições públicas, etc), como a lei municipal pretende.
Também a forma prevista para a cobrança da contribuição em relação a imóveis não edificados, no IPTU, terrenos estes que não contam com o serviço de iluminação pública nem possuem padrão instalado, é igualmente contestada pelo tributarista, o que, segundo ele, tem amparo em decisões do Tribunal Regional Federal, da 4ª Região. Aqui, também os imóveis edificados que não dispõem do serviço de iluminação pública, pela mesma razão, estão dispensados de cobrança da CIP.
Sobre estas questões também obtivemos outros pareceres, ainda que verbais, de advogados militantes nesta cidade, alguns deles em cargos de relevância na própria administração municipal, os quais igualmente apontam os mesmos problemas que agora, com certeza, a Câmara Municipal terá a oportunidade de corrigir, sem o que, provavelmente, instâncias outras poderão vir a ser chamadas em defesa dos contribuintes que, a bem da verdade, sequer dispõem a contento, dos serviços que a taxa recolhida mensalmente, deveria suportar.
Para se ter ideia do tamanho do problema, lembramos que, há muito tempo, os recursos da Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública, tem sido neste e quem sabe em outros municípios, utilizados para a quitação de débitos junto à Cemig, débitos estes, referentes ao consumo de energia por diversos repartições públicas, espalhadas por toda a cidade.
A realidade atual:
Em Formiga, apenas nos 4 primeiros meses deste ano, segundo dados retirados do Portal da Transparência, com recursos advindos da CIP, o município quitou (indevidamente?) junto a Cemig, o valor de R$ 525.769,42.
É óbvio que se a contribuição recolhida tivesse sua aplicação exclusiva, voltada para a finalidade a que ela se destina, a questão da iluminação pública neste município, não estaria tão crítica como de fato está.
Ora, se a empresa contratada através do Consórcio Cicanastra, recebe mensalmente algo em torno de R$ 50 mil para manter em funcionamento pleno a rede de iluminação pública (o que, como se sabe, não tem feito); fica claro que, se o que se arrecada fosse usado conforme foi concebido originalmente, a CIP resultaria sim, em benefícios para a população, mas, enquanto se destinar este enorme montante para quitar gastos com o custeio do consumo de energia da pesada máquina pública; por mais que se arrecade, a CIP jamais cumprirá sua finalidade.
Se não houvesse este ?desvio de finalidade?, conforme se depreende dos pareceres, certamente o valor da CIP, arcado pelos indefesos contribuintes, seria bem menos oneroso.
Comprovação da destinação (indevida) da Contribuição recolhida em janeiro 2015:
Conheça, na íntegra, o parecer do tributarista Euler Vespúcio – OAB 136641
1. Da previsão constitucional da Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública (CIP)
A Emenda Constitucional 39/02 outorgou competência para os Municípios e o Distrito Federal instituírem contribuição específica para a finalidade de custear os serviços de iluminação pública, incluindo o Artigo 149-A na Constituição Federal Brasileira:
Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.
Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.
2. É imposto, contribuição ou taxa?
A contribuição para o custeio de iluminação pública é uma contribuição e não uma taxa, pois visa arrecadar recursos para custear um serviço não divisível, sendo a iluminação pública um serviço de alcance universal, atendendo a todos os cidadãos.
Por seu lado, a contribuição para o custeio de iluminação pública é um tributo de caráter sui generis, que não pode ser confundido com imposto, porque a sua arrecadação se destina a finalidade específica, e nem pode ser uma taxa, por não exigir a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte.
A contribuição para o custeio de iluminação pública constitui, segundo Paulo Roberto Lyrio, uma quarta espécie de contribuição especial, posicionando-se ao lado das contribuições sociais, interventivas e corporativas.
Esta contribuição possui disciplina própria, a do Artigo 149-A da CF, sujeita, contudo aos princípios constitucionais tributários, por estar enquadrada na categoria no gênero tributo.
3.Da previsão legal da cobrança da contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública na cidade de Formiga
A Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002, instituiu a cobrança da Contribuição para Custeio de Serviço de Iluminação Pública (CIP) no município de Formiga.
Posteriormente, a Lei Municipal n°. 4.983, de 08.12.2014, alterou os Artigos 1º. a 5º.da Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002.
Passamos agora a análise das referidas leis.
3.a. Serviço de iluminação pública x iluminação dos bens de uso especial
A Resolução Normativa n°. 414, de 09/09/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), no parágrafo 6º., do Artigo 5º., traz a definição da classe iluminação pública, não deixando dúvida sob a sua abrangência:
6°. A classe iluminação pública, de responsabilidade de pessoa jurídica de direito público ou por esta delegada mediante concessão ou autorização, caracteriza-se pelo fornecimento para iluminação de ruas, praças, avenidas, túneis, passagens subterrâneas, jardins, vias, estradas, passarelas, abrigos de usuários de transportes coletivos, logradouros de uso comum e livre acesso, inclusive a iluminação de monumentos, fachadas, fontes luminosas e obras de arte de valor histórico, cultural ou ambiental, localizadas em áreas públicas e definidas por meio de legislação específica, exceto o fornecimento de energia elétrica que tenha por objetivo qualquer forma de propaganda ou publicidade, ou para realização de atividades que visem a interesses econômicos.
A alteração do Artigo 1º., da Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002, efetuada pela Lei Municipal n°. 4.983, de 08.12.2014, exorbitou a abrangência jurídica do que vem a ser iluminação pública, incluindo no seu rol o consumo de energia destinado aos prédios públicos no município de Formiga (por exemplo, Prefeitura Municipal, Câmara Municipal, etc.). Estes prédios públicos têm utilização efetiva, quantificável do bem de energia elétrica, sendo neste quesito equiparado a qualquer outro consumidor, devendo ser justo pagarem na medida do que efetivamente utilizar.
Já o parágrafo 5º., do Artigo 5º.da Resolução Normativa n°. 414, de 09/09/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), prevê definição da classe poder público, qual seja:
5º A classe poder público, independente da atividade a ser desenvolvida, caracteriza-se pelo fornecimento à unidade consumidora solicitado por pessoa jurídica de direito público que assuma as responsabilidades inerentes à condição de consumidor, incluindo a iluminação em rodovias e semáforos, radares e câmeras de monitoramento de trânsito, exceto aqueles classificáveis como serviço público de irrigação rural, escola agrotécnica, iluminação pública e serviço público, considerando-se as seguintes subclasses:
I ? poder público federal;
II ? poder público estadual ou distrital; e
III ? poder público municipal.
Neste ponto a alteração do Artigo 1º. da Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002, efetuada pela Lei Municipal n°. 4.983, de 08.12.2014, produziu uma excrescência e aberração jurídica, em desacordo com Resoluções da ANEEL e em ofensa ao consumidor comum, que vive a utilizar comedidamente a energia elétrica para ter uma conta com o valor monetário menor possível, pois o poder público, vindo a prevalecer esta conceituação equivocada de iluminação pública, incluindo os prédios públicos (órgãos públicos), não terá que arcar com os custos diretos e proporcionais ao seu consumo de energia elétrica.
Por outro lado, a competência do Município é para a instituição de contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, sendo este serviço o prestado à população em caráter geral nos logradouros públicos. Não se pode e não se deve, ser a arrecadação da CIP para o custeio das despesas de energia elétrica relacionados aos bens públicos de uso especial, como os prédios públicos em que funcionem órgãos do Município ou mesmo a Câmara dos Vereadores. Tal desvio (inciso II, do parágrafo 1º., do Artigo 1º., incluído como alteração da Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002, pela Lei Municipal n°. 4.983, de 08.12.2014), pode ser considerado inconstitucional, pois vai além da autorização constitucional.
3.b. Da isonomia da cobrança da CIP.
O serviço de iluminação pública não é um serviço nem específico, nem mesmo é divisível ou, seja, quantificável por pessoa. Neste sentido, ninguém poderá afirmar que a iluminação pública pode ser aproveitada de forma isolada por cada contribuinte, sendo um bem disponível para todos. Nem ao menos pode um cidadão que mora em uma determinada rua dizer que utiliza somente a iluminação pública fornecida na rua onde mora. Todos os cidadãos têm interesse que a integralidade das vias da sua cidade possua iluminação pública. Quanto a isto não pairam dúvidas.
O Artigo 3º. da Lei Municipal n°. 3.440, de 30.12.2002, e mesmo a sua alteração, efetuada pela Lei Municipal n°. 4.983, de 08.12.2014, não produz divisão equânime do consumo de energia da iluminação pública, ao cobrar a CIP de todos os imóveis, ocupados ou não, edificados ou não, e mesmo de imóveis que não têm infraestrutura básica e não têm o serviço de iluminação pública na rua onde está situado. Quando se cobra de forma progressiva, de forma desigual e na medida do consumo de energia efetivo das residências e comércio que possuem edificações urbanas, já se pode vislumbrar injustiça ao não fazer uma cobrança equânime. Comete-se maior injustiça quando se cobra de terrenos, alguns até não edificados, considerando-se a metragem linear da testada do imóvel.
O rateio para o custeio da iluminação pública deve ser de forma igual, por habitante, pois este serviço está disponível para todos. Entretanto, pelo previsto na lei municipal um mesmo contribuinte pode vir a pagar por até três formas a contribuição para o custeio da iluminação pública: na conta de energia do seu endereço residencial, na conta de energia do seu endereço comercial (serviço, comércio ou indústria) e, caso tenha imóvel não edificado, na conta do IPTU. Assim, mesmo todos tendo recebido de forma igual o serviço de iluminação pública, pode ocorrer o caso de contribuintes pagarem de forma desigual, sendo por isto esta cobrança considerada inconstitucional, por ofensa ao princípio da isonomia, previsto no Artigo 150, II, da Constituição Federal.
3.c. Da cobrança CIP em regiões sem iluminação pública
A cobrança para o custeio de iluminação pública, através de qualquer forma, não pode ocorrer de imóveis que não têm toda a infraestrutura básica instalada e não têm o serviço de iluminação pública na rua onde está situado, conforme decisões do Tribunal Regional Federal, da 4ª. Região.
Conclusão
A competência do Município e do Distrito Federal para instituir a contribuição para o custeio de iluminação pública deve ser exercida sobre os limites legais constitucionais definidos pela própria Constituição Federal e atender os princípios da isonomia, anterioridade, noventena.
A contribuição para o custeio da iluminação pública tem caráter universal e não é divisível.
A finalidade da CIP é arrecadar recursos para arcar com os custos da iluminação pública de logradouros públicos, sendo que quaisquer órgãos públicos, mesmo sendo de utilidade pública, não podem ter o seu consumo de energia elétrica pago com recursos da CIP.
A cobrança da CIP, de acordo com o princípio constitucional da isonomia, não pode gerar situações de cobrança desigual dos contribuintes. Assim, deve-se ter uma forma de cobrança única e geral para a arrecadação dos recursos da CIP.
Finalizando, não se pode arrecadar recursos de imóveis desprovidos de serviços de iluminação pública.