Existe uma grande possibilidade de a frase clichê que intitula a matéria ter sido criada provavelmente por alguma pessoa recém saída de um show do Paul McCartney. Estar presente em um show do beatle é confirmar, in loco, o status de mito vivo. E isso foi testemunhado por cerca de 130 mil pessoas nos dois dias de apresentações do inglês no estádio do Morumbi, em São Paulo, no início dessa semana. Por sorte, eu estava lá no domingo.
Durante o dia, nos arredores do estádio, já era possível perceber a imensa movimentação de fãs de diversas partes do país. Muitos deles identificados a partir de camisas e bandeiras de times de futebol. Cruzeiro, Atlético e América davam o tom dos mineiros. Mas havia gente de toda parte. Nem mesmo o calor que ultrapassava a barreira dos 30º C desanimou o público, que esperou horas e horas nas intermináveis e desorganizadas filas do Morumbi. Os portões foram abertos apenas no final da tarde. Prevendo chuva, ambulantes vendiam capas a R$ 5. Refrigerante, cerveja e água tinham preço médio de R$ 3 fora do estádio. Lá dentro, R$ 5. Um salgado tradicional como a batata Ruffles, R$ 6. Um mini sanduíche R$ 8. Mesmo assim, no final das contas, nada saía caro a partir do momento em que se caía na realidade de estar em um show tão diferente e aguardado.
Com pontualidade britânica, Sir Paul subiu ao palco por volta das 21h30. Logo na entrada, recebeu uma homenagem do público, que cantou ?We loves you yeah yeah yeah?, fazendo referência ao clássico dos Beatles ?She Loves You?. O ato fez com que Paul ficasse ao menos 30 segundos observando o público, sem falar nada ao microfone, entoando logo em seguida três clássicos na abertura: ?Venus and Mars / Rock Show / Jet?.
Após arriscar um português meia boca, porém esforçado, Paul começou a desfilar outros hits, começando pela dançante ?All My Loving?, da fase mais ?feliz? dos Beatles e ?Drive My Car?. Entre as músicas, Paul esbanjava simpatia. Fazia caras e bocas. Logo tirou seu paletó azul. Arriscava algumas frases em português como um constante ?e aí galera, tudo bem??.
?The Long and Winding Road? foi a primeira canção que ele cantou ao piano. Em seguida, dedicou ?My Love? para os namorados e para sua ?gatinha?, Linda. Prestou homenagens também a seus ex-parceiros Lennon e George em uma emocionante versão de ?Something?. Paul também aproveitou para tocar músicas de outros projetos como Wings e The Fireman, de 2008. A segunda metade do show foi clássico atrás de clássico, a partir da despretensiosa ?Ob-La-Di, Ob-La-Da?.
Os momentos mais emocionantes ficaram reservados para o final. Na dobradinha ?A Day in the Life / Give Peace a Chance?, Paul foi surpreendido por um viral criado pelos fãs na internet, que combinaram de levar balões brancos para serem erguidos durante a homenagem a Lennon. Em seguida, ao piano, entoou os uníssonos hinos ?Let it Be?, ?Hey Jude? e a literalmente explosiva ?Live and Let Die?, dotada com todas as doses de pirotecnia que um tradicional show de rock deve ter. Ao final dela, Paul se debruçou no piano fazendo um sinal negativo com a cabeça, como se estivesse pedindo ?desculpas? pela bagunça e pela fumaça.
Na volta dos dois pequenos intervalos, o cantor tocou apenas clássicos dos Beatles, como ?Daytripper?, ?Yesterday? e ?Helter Skelter?. Fechou a apresentação com ?Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band? e ?The End?. Empunhou uma bandeira do Brasil enquando seu tecladista segurava uma do Reino Unido. Distribuiu palhetas para o público. Correu de um lado para o outro. Na saída, tropeçou em uma caixa de som e foi ao chão, mas levantou comemorando logo em seguida como se nada tivesse acontecido. Três horas se passaram como se fossem três minutos. Ainda assim, é para contar para os netos.