Aprovado por lei em 2010, o uso das tornozeleiras eletrônicas ganhou visibilidade pelas mãos do juiz Sérgio Moro, na operação Lava Jato, e criou um mercado em franca expansão no Brasil. Nos últimos seis anos, cerca de 19 mil pessoas passaram a carregar o objeto de cerca de 200 gramas em volta de um dos tornozelos.

Há quatro empresas concorrentes, mas a maior delas, a Spacecom, que domina cerca de 90% das licitações, cresceu 296% entre 2011 e o fim de 2015. Outra empresa, a UE Brasil Tecnologia, afirma ter crescido 40% nos últimos dois anos.

O crescimento só não é ainda mais explosivo pela crise financeira em que os governos estaduais estão mergulhados. Dez estados não têm contrato até hoje com empresas que fornecem os equipamentos. No Rio de Janeiro, onde o empreiteiro Fernando Cavendish e o bicheiro Carlinhos Cachoeira continuam presos devido à falta de tornozeleiras, desde o fim de 2014, a Secretaria de Administração Penitenciária deixa de pagar fornecedores. E o Ministério Público apura ilegalidades na contratação da Spacecom sem licitação.

Em São Paulo, também há denúncia de irregularidades em contratos de tornozeleiras eletrônicas, e o serviço está paralisado desde março, pois expirou o contrato com a empresa que forneceu as tornozeleiras. A Secretaria de Administração Penitenciária abriu nova licitação, mas, enquanto isso, presos em regime semiaberto não podem ser monitorados.

A procura por fornecedores de monitoramento eletrônico pode se acirrar ainda mais a partir de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) divulgada semana passada. Uma súmula vinculante determina que, se não houver vaga suficiente em determinado presídio, o condenado poderá cumprir pena em casa, desde que use a tornozeleira.

Mesmo que a súmula vinculante não estivesse em vigor, o monitoramento eletrônico poderia ser aplicado aos cerca de 250 mil presos provisórios do país – aqueles que aguardam julgamento. Segundo defensores do modelo, para parte desses investigados a tornozeleira seria uma opção melhor do que estar atrás das grades. “Cerca de 40 mil provisórios poderiam estar com o dispositivo”, diz Renato de Vitto, do Departamento Nacional Penitenciário.

Dívida

A Spacecom, responsável pelo fornecimento dos equipamentos no Rio, disse que só retomará o fornecimento quando o Estado quitar o débito acumulado, que já chega a R$ 2,8 milhões.

Falta uniformizar as regras

Há críticas ao modelo de monitoramento por tornozeleiras. Relatório feito ano passado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), a pedido do Ministério da Justiça, diz que não há uma regra nacional que discipline seu uso. “A expansão dos serviços segue fluxos próprios em cada unidade da Federação”, diz o professor da pós-graduação em ciências sociais e criminais da PUC-RS, Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo.

O Departamento Nacional Penitenciário (Depen) confirma que não há padrão nacional, pois alguns Estados implantaram seus serviços de monitoramento com recursos próprios.

Por outro lado, centrais de monitoramento instaladas por meio de convênio dos Estados com o Ministério da Justiça “devem obedecer a critérios definidos em edital”. Em Mato Grosso, a Controladoria Geral do Estado descobriu que a empresa de tornozeleiras havia recebido R$ 1,3 milhão a mais do que estabelecido no contrato. O desvio é de 25% do total do contrato.

Segundo Renato De Vitto, a tornozeleira eletrônica é recomendada para presos com histórico de agressão, para os reincidentes em crimes leves ou para quem cometeu crimes de média ou alta periculosidade.

“O uso para criminosos de colarinho branco não é o que recomenda a literatura, porque esse tipo de delito financeiro não pode ser evitado com a geolocalização do preso. Enxergo o uso na Lava Jato mais como uma coisa simbólica, de mostrar que o condenado está solto, mas não impune, e como uma redução de danos”, afirma.

 

Fonte: O Tempo Online ||

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