Muito além do encarecimento de viagens internacionais e de produtos importados, a escalada do dólar já impacta preços de itens do dia a dia, como gasolina, produtos de higiene, remédios e até a energia elétrica e o pão francês.

Com a maior alta desde setembro do ano passado, chegando a R$ 4,10 neste mês, a moeda norte-americana acumula salto de quase 3% só em maio. A tendência, segundo especialistas econômicos, é a de que o dólar siga valorizado, pelo menos a médio prazo, afetando o mercado brasileiro. Os principais motivos são a guerra comercial entre Estados Unidos e China e o clima de instabilidade política no Brasil.

Os reajustes das tarifas de energia elétrica, entre 7% e 10%, que passam a valer na próxima-terça-feira, também foram motivados, em parte, pela subida da moeda estrangeira, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

“É claro que a escassez de chuvas, a baixa dos reservatórios e o desmatamento da Amazônia impactam demais na alta da energia. Mas o dólar é componente essencial. A tarifa de Itaipu é precificada em dólar. Logo, ela iria aumentar e esse repasse é feito ao consumidor”, diz o engenheiro eletricista Roberto D’Araujo, diretor do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético (Ilumina).

Para o economista Felipe Leroy, do Ibmec, a subida do dólar deve perdurar até o segundo semestre, impactando todos os setores.
“Acredito que a partir de julho teremos uma trégua na guerra comercial entre EUA e China porque o desgaste financeiro já é visível. Até lá, a alta vai elevar os preços em todos os segmentos, da gasolina aos remédios”, avalia Leroy.

Um dos itens mais vulneráveis é o pão francês, que já sentiu a elevação da moeda. Em Minas, o presidente da Associação Mineira da Indústria de Panificação (Amipão), Vinícius Dantas, diz que o mercado absorveu um aumento de 3% no preço da farinha de trigo, principal matéria-prima do pãozinho.

Apesar disso, os empresários do setor afirmam que têm segurado o repasse para a clientela, de olho nas movimentações políticas do país, que podem ajudar a alterar esse cenário. “Estabelecemos prazo de 40 a 45 dias, antes de repassar o aumento ao consumidor. É o tempo para votar a reforma da Previdência, e o mercado tem esperado essa aprovação para reagir. Se a reforma for aprovada, a situação melhora porque o investidor externo terá mais confiança para investir”, analisa Dantas.

 

Setores

Em alguns setores da economia brasileira, a alta do dólar impacta imediatamente o mercado. No caso do turismo, as perdas chegam a 20% em apenas dois meses, segundo José Maurício, presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens de Minas Gerais (ABAV-MG).

“As viagens internacionais são o termômetro mais imediato com a alta do dólar. As viagens para Europa e Estados Unidos caíram mais de 20% e estão sendo trocadas por destinos nacionais. Até o Nordeste, que muitas vezes compete com os preços do exterior, tem sido mais atrativo nesse cenário”, explica José Maurício.

Pesquisa realizada neste mês pela Kayake, empresa focada em ferramentas de busca de viagens na internet, revelou que os 15 destinos mais buscados pelos brasileiros neste ano são nacionais.

“As praias sempre estão entre os destinos preferidos, mas raramente não há um país europeu, por exemplo, como agora. É uma situação atípica”, completa ele.

Quem também sente forte a alta do dólar são as casas de vinhos importados. O empresário Gabriel Roberto, diretor de e-commerce da Casa Rio Verde, uma das mais tradicionais de Belo Horizonte, diz que todos os rótulos importados de vinhos tiveram uma alta de pelo menos 8% a 10% nas últimas semanas.

Em um eventual cenário sem reversão da moeda norte-americana nos próximos meses, Gabriel Roberto acredita que a inflação dos vinhos deva atingir também as marcas nacionais.

“Ainda não repassamos ao consumidor esses reajustes, mas é inevitável. Vai acabar acontecendo nas próximas semanas, ainda que o consumo esteja muito fraco devido ao desemprego alto e por causa das incertezas do mercado com as reformas necessárias”, diz.

Como reflexo direto da subida da cotação do barril de petróleo no mercado internacional —que é vendido em dólar – a gasolina já disparou. Nesta semana, o litro do combustível saltou de R$4,9516 para R$5,0473 na maioria dos postos de BH e da região metropolitana. Para Bráulio Chaves, ex-diretor do Minaspetro e especialista em combustíveis, o mercado deve explorar ao máximo essa alta.

“Ainda que o preço do barril seja muito volátil, dificilmente ele cairá em meio a essa guerra comercial internacional. É necessária a mínima estabilidade para puxar o preço da gasolina para baixo de novo. E os empresários brasileiros vão esperar por isso, claro”, diz Chaves.

 

Fonte: Hoje em Dia ||

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