Entre os muitos efeitos da pandemia sobre os sistemas de saúde está o aumento na demanda por hemodiálise – seja durante a internação do infectado em estado grave ou mesmo no pós-internação, como sequela da doença. Dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) indicam que houve um aumento de ao menos 3,4% no número de pessoas com doenças renais crônicas que dependem da máquina para filtrar o sangue na rede pública.
Essa demanda foi observada também na rede privada. Segundo levantamento do grupo hospitalar Americas Health, cerca de 50% dos pacientes graves internados na UTI Covid cursam com lesão renal e diminuição das funções dos rins. Cerca de 35% dos pacientes internados tiveram indicação de realização de hemodiálise, sendo que os principais fatores de risco foram a obesidade e uma condição renal crônica prévia.
Por causa do aumento na demanda por hemodiálise, o Hospital da Baleia ampliou em 25% a capacidade de atendimento do Centro de Nefrologia. O número de cadeiras aumentou de 56 para 70, permitindo que 420 pacientes possam ser atendidos mensalmente – antes eram 420. O planejamento é que o número de cadeiras aumente para 105 até 2023.
“A Covid tem um acometimento muito característico do rim. Existe uma demanda do paciente que foi internado por Covid e ficou com o rim comprometido temporariamente, mas também há pessoas que acabaram se curando da Covid mas ficando com uma doença renal crônica”, explica Cynthia Lloyd, assessora da superintendência técnica do Hospital da Baleia.
Segundo a especialista, mesmo que a pandemia esteja mais controlada neste momento, a demanda por hemodiálise tende a continuar muito alta. Primeiramente, porque o coronavírus deve continuar circulando na sociedade e porque muitas vítimas da Covid vão continuar demandando a diálise, porque seus rins não conseguem mais filtrar o sangue.
Além disso, a doença renal crônica está diretamente relacionada a outras enfermidades comuns na população, como diabetes e hipertensão.
A rotina de quem depende da máquina de diálise para manter a vida não é fácil. A pessoa precisa ir ao hospital ou clínica três vezes por semana e esperar quatro horas pelo processo de filtragem do sangue. “O paciente precisa ter uma disciplina muito grande. Deve controlar a alimentação e a ingestão de líquido, porque não pode ter retenção hídrica”, explica Cynthia.
O cuidado para não ser infectado pelo coronavírus também é fundamental. Um estudo realizado nos Estados Unidos indicou que um paciente com doença renal crônica tem 40 vezes mais chances de ser internado quando está com Covid. Por isso, esse grupo é considerado, desde o início da vacinação, como prioritário.
Drama de ter a vida por um fio
O caminhoneiro Ubirajara Martins da Fonseca, 54, sabe muito bem da importância dessa disciplina. “No feriado, o pessoal foi para um sítio curtir um churrasco, mas não pude ir, porque eu tinha diálise e não tem como faltar”, relata.
A vida dele se transformou completamente em 2018, quando foi parar no hospital por causa de uma obstrução intestinal. Após a cirurgia, ele sofreu uma infecção generalizada, que afetou o funcionamento do fígado e dos rins. Esteve perto da morte e sobreviveu, mas passou a depender da máquina para ter o sangue filtrado.
Fora da fila
E Fonseca não pode ainda entrar para a fila do transplante de rins, porque aguarda a realização da cirurgia para a retirada da bolsa de colostomia – que deveria ter sido feita há meses, mas não pôde porque as cirurgias eletivas tiveram de ser paralisadas nos picos da pandemia.
“Antes de 2018, eu não conheci nenhum tipo de doença, tinha uma vida muito saudável. Mas entrei no hospital com 82 quilos e saí de lá com 40. Tive oito passagens pelo CTI, fui dado como morto várias vezes. Mas não faço as contas do que perdi, mas do que ganhei. Sou grato pela sobrevivência”, assegura o caminhoneiro, que está afastado do trabalho desde a primeira internação.
Neste ano, Fonseca ainda enfrentou um grande susto ao ser infectado pelo coronavírus. Por saber que a mortalidade é maior entre pessoas com doenças renais, temeu ser internado novamente. “Senti medo de virar estatística. Mas graças a Deus superei bem a doença. Só tive sintomas leves”, relembra.
Fonte: O Tempo