Durante os dias 22 a 31 de agosto aconteceu, em São Paulo, a 23ª Bienal Internacional do Livro. Montada no pavilhão de exposições do Anhembi e realizada pelo Câmara Brasileira do Livro (CBL) e pelo Sesc São Paulo, é o maior evento do gênero da América Latina. Este ano o tema da Bienal foi ?Diversão, Cultura e Interatividade: Tudo Junto e Misturado?, dividido entre oito espaços: Salão de Ideias, Espaço Imaginário, Arena Cultural, Bibliotecas, Edições Sesc, Anfiteatro, Escola do Livro e Cozinhando com Palavras. Calcula-se que 720 mil visitantes passaram pelo local ao longo dos 10 dias de evento, um número dentro da meta prevista de mais de 700 mil pessoas, mas menor do que o da bienal de 2012, que reuniu 750 mil pessoas.
Ainda que com público menor, os números que compuseram o evento foram superlativos: 186 autores nacionais, 22 estrangeiros, R$34 milhões de investimento, mais de 300 expositores, 2 mil escolas, além da presenças de celebridades e personalidades tão diversas quanto Fernanda Montenegro, Ronnie Von, Paulo Vinícius Coelho e Cassandra Claire. Mas nem só de grandes nomes viveu a Bienal, onde era possível encontrar também pequenas casas de editoração, publicações experimentais e enormes obras consagradas. A maior, em vários sentidos, foi uma edição de super luxo de ?Gênesis?, livro do fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, que estava em promoção durante o evento por meros R$12 mil. Esta mesma obra fora da feira custa pouco mais de R$14 mil. No entanto, esta foi uma mera curiosidade dentro de um universo de publicações que tinha como foco muito mais a disseminação da cultura e o fomento da leitura do que a venda de obras desproporcionais. Na verdade, o Sesc ? curador do evento ? tenta distanciar a Bienal do caráter de ?feira?, no sentido de ser um grande acontecimento de varejo de livros e material editorial. Tarefa, por enquanto, ainda impossível, uma vez que as editoras visavam a venda da maior quantidade de livros possível ? meta, esta sim, não só factível como muito bem realizada. Foi comum encontrar filas para entrar em alguns estandes e, uma vez lá dentro, mais filas para se chegar aos caixas.
As filas foram, na verdade, sintoma do maior ponto de reclamação dos visitantes: a falha de organização em alguns pontos do processo. Especialmente no controle e direcionamento da multidão de atendentes. Mesmo mirando um público perto de um milhão de pessoas, os organizadores não conseguiram instalar um sistema de atendimento ao público eficiente o suficiente para manter em movimento o fluxo de pessoas que chegava ao evento ou que já estava dentro do pavilhão do Anhembi. O resultado foram filas imensas para a compra de ingressos, para a entrada no evento, para pegar os ônibus gratuitos e para visitação de vários estandes. Especialmente durante os dois finais de semana, quando o público chegava perto das 200 mil pessoas por dia.
Ainda assim, nada que tirasse a alegria de quem estava ali para comprar livros e apreciar a grande diversidade de cultura que o lugar oferecia. ?Isso aqui é o paraíso?, disse Arthur Tavares, estudante e fã de histórias em quadrinhos, livros de fantasia e séries de TV. Gêneros muito bem representados na edição deste ano. Estavam na feira, além da já citada Cassandra Claire, autora da série de livros ?Os Instrumentos Mortais?, Jeff Lindsay, autor do romance que deu origem à série de TV ?Dexter?, os nacionalmente consagrados Ziraldo, Mauricio de Sousa, Thalita Reboulças e Paula Pimenta, entre outros.
Seguindo à risca o tema de união e mistura, o evento recebeu de Hermeto Pascoal a Emicida, de autores iniciantes a HarlanCoben, de publicações de terror a livros infantis. Dentro desta categoria, vale ressaltar o lançamento de ?Bidu ? Caminhos?, obra da Mauricio de Sousa Produções editada pela Panini, escrita e desenhada pelo formiguense Eduardo Damasceno e por Luis Felipe Garrocho. O livro em quadrinhos conta a história do cachorro azul mais famoso dos quadrinhos nacionais e de como ele e seu dono, Franjinha, se conheceram. A dupla ainda participou de duas sessões de autógrafos e deu duas oficinas de quadrinhos durante a Bienal. No Salão de Ideias, participaram de um bate-papo com o próprio Mauricio de Sousa, com o editor Sidney Gusman e com Danilo Beyruth, autor e Astronauta ? Magnetar.
O mesmo Salão de Ideias recebeu ainda palestras com livreiros sobre os novos caminhos que as livrarias têm que contemplar dentro do mercado editorial que se coloca no Brasil e no mundo hoje. Atendido por grandes nomes nacionais e internacionais, o painel deixou claro que a livraria está deixando de ser um lugar apenas para compra livros e passando a ser um espaço multicultural e de sociabilidade que faz também o papel de difusora do livro e da cultura.
O Espaço Imaginário foi o lugar das oficinas e teve uma programação mais voltada para o público infantil e infanto-juvenil, com mais de cem atrações diversas ao longo do evento. Entre os nomes que ministraram oficinas ou participaram de mesas redondas, Fábio Yabu, Érica Awano e Paula Furtado. Em pauta, o fazer e o contar histórias que estimulam o hábito de ler e forma novos públicos e autores.
A Arena Cultural foi o grande espaço de interatividade e da discussão a respeito das tendências atuais da literatura. Entre os convidados, Ken Follet, Miriam Leitão e Mário Sérgio Cortella.
Na biblioteca Bibliosesc Praça da Palavra, o tema eram as narrativas contemporâneas e os convidados foram de Rapin Hood à Clara Averbuck, enquanto o anfiteatro recebeu aqueles que transformam as palavras em música ou artes cênicas, como Zélia Duncan e Zeca Baleiro.
Mas talvez o espaço mais inusitado desta edição da Bienal tenha sido o Cozinhando com Palavras, que apresentou chefs-autores que ministraram aulas-show em uma cozinha especialmente montada dentro do estande. Além de comida, muita conversa sobre culinária e literatura com nomes como Palmirinha Onofre e André Boccato, além de um painel especial em homenagem à personagem Magali, da Turma da Mônica, que em 2014 completa 50 anos de sua primeira aparição nos quadrinhos.
O ideal do evento foi fazer com que as atrações e programação espelhassem as mais diferentes vertentes da literatura. Por isso, cruzavam-se grupos de adolescentes acompanhados ou não dos pais, grupos de escolas (supervisionados por professores e monitores), antigos apreciadores de literatura, novos leitores e uma moderna classe de consumidores que até pouco tempo não existia no Brasil: a do apreciador de cultura que agora tem condições de se interessar por um (ou por alguns) segmentos do mercado editorial. Este grupo, ainda não denominado, é composto por pessoas de diferentes idades que só há pouco tempo se interessou mais seriamente pela literatura, seja devido a grandes fenômenos editoriais, a grandes nomes de fora do mundo das Letras que viram no livro uma maneira viável de atingir o seu público-alvo, ou a outro fator qualquer. A possibilidade de mais pessoas terem acesso à literatura levou a uma maior estratificação do mercado de livros e de produtos de entretenimento. O que, por sua vez, abriu espaços para outros autores antes impraticáveis. Por isso a preocupação de tradicionais livreiros com as novas possibilidades de publicação individual ? que dispensa editoras e vai direto do autor para o leitor ?, bem como com descobrir antes de qualquer um a próxima grande maravilha internacional de venda e com a chance de atrair para seus casas de edição nomes que não necessariamente se integram ao que é comumente conhecido como literatura brasileira.
A maior prova desta tendência durante a Bienal foi o espaço Cozinhando com Palavras e suas atrações com chefs que são autores ou que contrataram profissionais das Letras para coescrever livros de receitas e/ou de memórias. Tal diferenciação mercadológica no Brasil de alguns anos atrás era impensável. Mas a mistura de cozinha e letras está longe de ser a única ?novidade? do mercado editorial atual. Os já citados quadrinhos, os livros religiosos e as trilogias fantásticas são apenas alguns outros exemplos de desmembramentos deste mercado que se desenvolvem cada vez mais para além das áreas já consagradas.
Independente do gênero ou de gostos pessoais, é interessante perceber as mais diferentes áreas de conhecimento contempladas no panorama geral do mercado que a Bienal Internacional de São Paulo apresenta. Ao mesmo tempo, torna-se quase surreal o fato de que Formiga não possui uma única livraria voltada para o público geral, uma vez que o mercado hoje apresenta tantas opções e do fato do espaço da livraria estar sendo tão discutido.
Acontece este ano ainda, em Belo Horizonte, entre os dias 14 e 23 de novembro, a Bienal do Livro de Minas Gerais. É mais uma chance para formiguenses leitores, professores e profissionais da área que querem conhecer mais sobre o mercado e suas possibilidades. Para quem pretende conhecer a maior feira de livros da América Latina, a próxima bienal de São Paulo acontecerá em agosto de 2016, mas ainda sem data precisa definida. Há tempo hábil para se programar para a viagem e tempo mais do que suficiente para se aventurar no mundo literatura de qualidade.
Boa leitura!

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