O Ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, discursou nesta quarta-feira (10) na COP26 fazendo uma defesa da gestão Bolsonaro, cobrando os países ricos por mais recursos e ainda sinalizando que é contra o que chamou de “lógica negativa da punição, da sanção e da proibição”.

Retomando um ponto caro à gestão Salles, Leite cobrou por recursos. “A meta de 100 bilhões de dólares não foi cumprida e esse valor já não é mais suficiente. (…) São necessários volumes mais ambiciosos”, disse Leite, fazendo referência ao valor prometido desde 2009 pelos países ricos e que não foi repassado aos em desenvolvimento.

O tema ainda é um dos pontos de entrave nas negociações da COP26.

Metas ambiciosas? Críticos discordam

Leite começou o discurso falando sobre as metas climáticas anunciadas na abertura da COP26: redução de emissões de 50% até 2030 e neutralidade climática até 2050; zerar o desmatamento ilegal até 2028; e apoio à redução global de metano.

Entretanto, especialistas em meio ambiente lembram que o país voltou ao seu compromisso anterior, de 2015.

“A coisa mais falaciosa que ele disse é sobre as metas brasileiras que aumentaram de ambição. O que o governo fez agora não foi aumentar a ambição, ele simplesmente retornou aos números que já existiam em 2015”, explica Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.

“Não teve um avanço. É mais ou menos o que acontece com o preço dos produtos no Black Friday, o governo fez uma Black Friday de carbono, onde você aumenta antes de dar o desconto”, diz Astrini.

O especialista Marcelo Furtado, fundador da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agropecuária concorda.

“Ele falou que o país adotou metas mais ambiciosas – mas sabemos que, na verdade, o país simplesmente voltou ao seu compromisso anterior. Ressaltou a questão de energias renováveis, mas não disse que o governo está fomentando a participação de energias fósseis em sua matriz energética”, completa Furtado.

Defesa da gestão

Durante o discurso, Leite ainda defendeu o que chamou da “força da atual e real política ambiental brasileira” e destacou que, segundo o governo, os recursos para a área ambiental foram dobrados e novos concursos para agentes ambientais foram abertos.

O ministro listou uma série de pontos que considera positivo na gestão, mas não citou o aumento da devastação da Amazônia ou a “pedalada nas metas de carbono”, entre outros pontos criticados por ambientalistas.

“Para conter o desmatamento ilegal na Amazônia, o Governo Federal dobrou os recursos destinados às agências ambientais federais e promoveu abertura de concursos para 739 novos agentes ambientais”, disse o ministro.

Astrini diz que o governo usa os números de uma forma não honesta. “Quando ele [Joaquim Leite] fala que contratou 700 fiscais, não é bem isso. Você tem 96 fiscais nesses 700 contratados. O resto é auxiliar administrativo, serviço de copeiro, não é uma contratação de fiscais. O número é aquele, mas quem fiscaliza está em uma parte pequena”, comenta Astrini, do Observatório do Clima.

Futuro verde já começou?

Analisando outro ponto do discurso, Furtado, especialista da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agropecuária, critica a afirmação de que o futuro verde do Brasil já começou.

“[O ministro] Terminou o discurso dizendo que ‘o futuro verde já começou no Brasil’. Na prática, o país aumentou seu desmatamento, a participação das térmicas em sua matriz energética e não avançou em sua ambição climática”, diz Furtado.

Floresta e pobreza

Em um dos pontos do discurso, o ministro afirmou que, onde existe muita floresta, “também existe muita pobreza” e destacou um programa recém-lançado pelo governo federal.

“Reconhecemos também que onde existe muita floresta, também existe muita pobreza. Para promover o desenvolvimento sustentável da região criamos o Programa Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais Floresta+, que busca fomentar o mercado de serviços ambientais, reconhecendo e remunerando quem cuida de floresta nativa”, disse Leite.

Astrini contesta essa fala do ministro. “Onde existe desmatamento, existe pobreza. Mas onde existe floresta, existe riqueza. Sem a Amazônia, o regime de chuva no Brasil teria acabado. É da floresta que você pode tirar frutos, fármacos, cosméticos, uma indústria de tecnologia, de pesquisa”, diz Astrini.

A Amazônia é uma Mega-Sena ambiental do planeta. Pobreza é a cabeça do ministro”, afirma Astrini.

Poucos dias antes da COP, o Brasil lançou o o Programa Nacional de Crescimento Verde, que sistematiza as ações do Brasil na área ambiental e de desenvolvimento sustentável. Entretanto, a iniciativa não trouxe detalhes de ações e objetivos.

‘Esse pacote é vazio [Programa Nacional de Crescimento Verde], não existe nada. O que eles fizeram foi assinar um decreto que muda o nome de um grupo de trabalho. Não há absolutamente nada dentro desse pacote de crescimento verde”, alerta Astrini.

Mais recursos, menos punições

Leite também cobrou o financiamento dos países ricos. Ele lembrou a promessa de 100 bilhões de dólares ainda não cumprida. “Meta não foi cumprida e não é mais suficiente”, disse, citando que é preciso “volumes mais ambiciosos”.

“A meta de 100 bilhões de dólares não foi cumprida e esse valor já não é mais suficiente (…). São necessários volumes mais ambiciosos, de fácil acesso e execução ágil, para que a transformação ocorra de forma inclusiva em cada território ao redor do mundo, prioritariamente em regiões mais vulneráveis em relação a clima e desenvolvimento e econômico”, diz Joaquim Leite.

Em referência direta aos países ricos, Joaquim Leite cobrou empenho.

“Os países que historicamente e atualmente são os responsáveis pelos maiores volumes de poluição da atmosfera devem demonstrar suas efetivas ambições de financiamento nessa conferência, sem postergar ainda mais um compromisso assumido em 2015 e até o momento não realizado em sua plenitude” , afirma Leite.

O ministro finalizou o discurso em uma citação ao que chamou de lógica das ‘punições’. Ele não detalhou o que entende pelo termo, mas cada vez mais a sociedade internacional discute formas de adotar medidas contra países que baseiam suas atividades produtivas em processos geradores de gases de efeito estufa.

Para o Brasil, o impacto de medidas restritivas pode afetar, por exemplo, a cadeia da agropecuária, que é uma das principais emissores de carbono do país.

“O desafio global a ser superado é reverter a lógica negativa da punição, da sanção e da proibição, para a lógica positiva do incentivo, da inovação, da priorização. É necessário transformar a agenda ambiental em oportunidade de crescimento econômico e geração de empregos verdes. A partir de uma visão construtiva, encontraremos o caminho para criar o futuro sustentável que desejamos a todos. O futuro verde já começou no Brasil” , afirma o ministro do meio ambiente.

Fonte: G1

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