Pela primeira vez na história, o número de crianças e adolescentes com obesidade superou o de jovens desnutridos no mundo. A constatação faz parte do relatório “Alimentando o Lucro: como os Ambientes Alimentares Estão Falhando com as Crianças“, divulgado nessa quarta-feira (10) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), com base em dados de mais de 190 países.
Segundo o levantamento, entre os anos 2000 e 2025, a prevalência de desnutrição infantojuvenil caiu de 13% para 9,2%, enquanto os casos de obesidade saltaram de 3% para 9,4% no mesmo período. Atualmente, uma a cada cinco crianças ou adolescentes entre 5 e 19 anos está acima do peso, o que representa cerca de 391 milhões de jovens, dos quais 188 milhões são obesos.
Apenas em regiões como a África Subsaariana e o Sul da Ásia o número de jovens desnutridos ainda supera o de obesos, mantendo um padrão diferente do resto do mundo.
Brasil acompanha tendência global com crescimento expressivo
O relatório destaca o Brasil como um dos países em que a mudança do perfil nutricional infantojuvenil foi mais expressiva. Em 2000, 5% das crianças e adolescentes estavam com obesidade, contra 4% em situação de desnutrição. Em 2022, a obesidade triplicou, chegando a 15%, enquanto a desnutrição caiu para 3%. O índice de sobrepeso também aumentou consideravelmente, passando de 18% para 36% nesse período.
Outros países com altas taxas incluem nações das Ilhas do Pacífico, onde a obesidade atinge até 30% dos jovens. A prevalência também é significativa em países de alta renda: 27% no Chile, 21% nos Estados Unidos e 21% nos Emirados Árabes Unidos.
Ultraprocessados e marketing são apontados como principais vilões
O Unicef alerta que a substituição de alimentos naturais por produtos ultraprocessados é a principal causa do avanço da obesidade. O estudo destaca o impacto do marketing voltado ao público jovem como um fator central nesse cenário.
“Esses produtos dominam comércios e escolas. A indústria de alimentos e bebidas tem acesso poderoso ao público jovem”, alerta a publicação.
O consumo elevado de ultraprocessados está associado ao aumento de doenças graves como resistência à insulina, hipertensão, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer, como os de pâncreas e fígado.
A diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, reforça a gravidade da situação:
“Os alimentos ultraprocessados estão substituindo cada vez mais frutas, vegetais e proteínas, justamente quando a nutrição desempenha um papel crítico no crescimento, desenvolvimento cognitivo e saúde mental das crianças”.
Especialistas defendem políticas públicas urgentes
Especialistas alertam que o enfrentamento da obesidade infantil deve ir além do esforço individual ou familiar, exigindo políticas públicas eficazes. Entre as ações recomendadas estão a regulação da publicidade infantil, a taxação de produtos ultraprocessados e o aumento da acessibilidade a alimentos saudáveis.
A médica Maria Edna de Melo, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), defende uma abordagem mais ampla:
“Não se trata apenas de força de vontade. A questão envolve biologia e ambiente. Por isso, a prevenção precisa ser encarada com urgência”.
Com informações do Metrópoles