Durante a aplicação de uma prova, Antônio Daniel Fernandes Coelho, de 42 anos, professor do curso de veterinária da Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac), em Juiz de Fora, na Zona da Mata, levou um soco no rosto do estudante Silvério Geraldo França, de 28, de acordo com registro feito pela Polícia Militar. A agressão reforça dados da pesquisa divulgada pelo Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro-MG). Intitulado Rede particular: vida de professor e violências na escola, o estudo mostra que ataques verbais e ameaças também fazem parte da realidade das escolas privadas, da educação infantil ao ensino superior.
São, geralmente, atos violentos praticados por jovens, aqueles mesmos donos da responsabilidade de ser o futuro da nação. Os mesmos jovens vítimas de violência, como o estudante da PUC Minas baleado segunda-feira depois de sair da faculdade. A vulnerabilidade dessas pessoas à violência também fora da escola é tão grave que foi foco de relatório divulgado terça-feira pelo Ministério da Justiça.
É a primeira vez que as portas de instituições particulares de ensino se abrem para o tema violência, comprovando que esse cenário não se restringe às escolas públicas. 62% dos professores entrevistados disseram ter presenciado agressão verbal em estabelecimentos de ensino. Quase um quarto revelou ter visto agressão física, como a do professor da Unipac. Mais de um terço deles já viu situações de intimidação e ameaças. Um quinto dos profissionais comprovaram a existência de tráfico de drogas nas escolas. Mais da metade já testemunhou episódios de danos ao patrimônio da escola e um quinto presenciou danos ao patrimônio pessoal. Não foi perguntado aos entrevistados se já foram alvo de violência.
Embora tenham sido entrevistados 686 professores de todo o estado, a pesquisa tem como pano de fundo um universo de 70 mil professores de 4.484 escolas particulares de Minas. A amostragem foi escolhida entre os 25 mil sindicalizados. A maioria das instituições está na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Foram investigados mais de 30 tipos de violência, desde indisciplina, passando por roubo, discriminação até homicídio. Grande parte das respostas se refere à relação professor-aluno. Além de escancarar um quadro de violência em locais onde se paga por educação, a pesquisa também aponta supostas causas para o problema. Para a maioria dos professores (75%), a omissão familiar é uma das principais responsáveis por atitudes violentas de alunos. Pouco mais de um quarto (27%) concordam que uma vizinhança violenta tende a influenciar o ambiente escolar.
Segundo o presidente do Sinpro Minas, Gilson Reis, o estudo evidencia que a violência fora dos muros das escolas particulares é também reproduzida nesses ambientes. Ele acrescenta que o fenômeno tem se aprofundado ao longo da década. Desde então, a relação cliente-serviçal está se sobressaindo à relação professor-aluno. Vemos também que a família transfere completamente para a escola a educação dos filhos. Percebemos, entretanto, que este problema ainda está muito internalizado, pois instituições escondem casos de violência e professores ficam intimidados, temendo a perda do emprego, afirma.
Na pele
Diretor do Sinpro Minas e professor do Centro Universitário UNI-BH, Marco Eliel de Carvalho é dos poucos que têm coragem de falar sobre a realidade violenta nas escolas particulares. Há dois anos precisou sair escoltado por seguranças do prédio, temendo a ameaça de um aluno. Ao contestar uma nota baixa, começou a gritar. Pedi para se retirar da sala e ele se recusou. Quando decidiu sair, estava transtornado, diz. Carvalho é um dos que acreditam que o problema esteja centrado na fragilidade das relações familiares. Ela também passou a ser uma relação de troca. Dentro da sala de aula o estudante reproduz esse quadro, sob o discurso de quem paga o salário do professor é ele. Para resolver, é necessário que haja diálogo entre professores, família e sociedade sobre como conviver com a diferença.
Embora o alvo das pesquisas seja o professor, há estudante que reconheça a gravidade da situação. Uma aluna de uma escola particular do Bairro Buritis, na Região Oeste de BH, que pediu anonimato, conta que há poucos dias uma de suas professoras saiu da sala chorando, depois de ser insultada por um aluno. Soltam peido-alemão (barbante embebido em substância química, que, quando queimado, libera forte mau cheiro), conversam muito alto. Já houve até roubo de celular em sala. De mais de 40 alunos, só 10 salvam na turma, conta.
Para a vice-presidente do Sindicato das Escolas Particulares do Estado de Minas Gerais (Sinep-MG), Zuleica Reis, esse retrato está longe daquele percebido pela instituição, que representa mais de 700 escolas em Minas.O professor é a pessoa mais valorizada na escola. A direção nunca permitiria que houvesse qualquer tipo de agressão. Quando isso ocorre, imediatamente as famílias são chamadas, além dos serviços de orientação psicológica.

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