O tenente-coronel Mauro Cid afirmou em delação premiada à Polícia Federal (PF) que Jair Bolsonaro (PL) recebeu US$ 86 mil decorrentes da venda de joias recebidas como presentes enquanto chefe de Estado. O ex-presidente e outras 11 pessoas foram indiciadas no caso das joias sauditas, em julho do ano passado. Elas respondem pelos crimes de peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
O valor (quase R$ 500 mil na cotação atual), corresponde a US$ 68 mil obtidos com a venda dos relógios Rolex e Patex Philippe a uma loja na Filadélfia , em junho de 2022, e mais US$ 18 mil da venda de um kit de joias em ouro branco em um centro especializado de Miami – as duas cidades ficam nos Estados Unidos.
O kit de joias em ouro branco e o Rolex foram recebidos por Bolsonaro em viagem oficial feita à Arábia Saudita em 2019. Já no fim de 2021, o então presidente pediu que o ajudante de ordens pesquisasse o preço do relógio Patek Philippe, outro presente recebido no Oriente Médio
Mauro Cid foi aos EUA acompanhando Bolsonaro em viagem oficial, com dinheiro e estrutura do Estado brasileiro. O tenente-coronel contou aos investigadores que teve ajuda do pai, o general da reserva Mauro César Lourena Cid, então residente nos EUA, na missão de encontrar lojas especializadas que pudessem comprar as joias.
O valor dos itens de luxo, ainda segundo o ex-ajudante de ordens, foi fracionado e entregue em espécie a Bolsonaro em diferentes ocasiões, para evitar que “circulasse no sistema bancário”.
Mauro Cid disse que o pai dele entregou o dinheiro apurado com a venda das joias da seguinte forma:
- O general Lourena Cid entregou US$ 30 mil a Jair Bolsonaro em setembro de 2022, durante a abertura da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York.
- US$ 10 mil foram entregues no fim daquele ano, mas em Brasília, em um evento da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex).
- Outros US$ 20 mil chegaram às mãos de Bolsonaro em fevereiro de 2023, durante visita do ex-presidente à residência de Lourena Cid em Miami.
- Os US$ 28 mil restantes foram dados a Bolsonaro no mês seguinte, por meio do assessor Osmar Crivelatti.
- Bolsonaro alegou que dinheiro custearia processos judiciais e multas de trânsito
- Ainda segundo Mauro Cid, Jair Bolsonaro alegou que precisava do dinheiro das joias para cobrir contas provenientes de processos judiciais e multas de trânsito decorrentes da falta de capacete nas motociatas realizadas em diferentes cidades durante seu mandato. Do total apurado com a venda das joias,
- Mauro Cid disse “que apenas retirou os custos que teve com passagem aérea e aluguel do veículo”.
“No começo de 2022, o presidente Jair Bolsonaro estava reclamando dos pagamentos de condenação judicial em litígio com a Deputada Federal Maria do Rorário e gastos com mudanças e transporte do acervo que deveria arcar, além de multas de trânsito por não usar o capacete nas motociatas; diante disso, o ex-Presidente solicitou ao colaborador quais presentes de alto valor que havia recebido em razão do cargo”, diz trecho da transcrição do depoimento de Mauro Cid.
O episódio das joias sauditas veio à tona por meio de reportagem do Estadão, após assessores de Bolsonaro tentarem entrar no Brasil com um conjunto de joias da Arábia Saudita, em outubro de 2021, sem declarar aos órgãos oficiais. Ele foi avaliado oficialmente pela Receita Federal em cerca de R$ 5,6 milhões no ato da apreensão no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.
Portanto, o kit de joias da Chopard não está entre os itens vendidos citados por Mauro Cid. O kit apreendido inclui um colar, um par de brincos, um anel e um relógio de pulso, avaliado em US$ 1 milhão (cerca de R$ 5,7 milhões na cotação atual). Havia ainda uma miniatura com pedestal de um cavalo, quebrada no transporte e avaliada em US$ 1 mil (cerca de R$ 5,7 milhões).
Mauro Cid, que era ajudante de ordens e um dos mais próximos assessores de Bolsonaro quando ele estava na Presidência da República, detalhou a negociação em um depoimento tornado público nesta quarta-feira (19), após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubar o sigilo das delações do tenente-coronel.
A decisão é decorrência da denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Bolsonaro e mais 33 pessoas por tentativa de golpe e outros crimes. No mesmo despacho, Moraes notificou os denunciados. Caso o STF aceite a denúncia, eles se tornarão réus numa ação penal.
Fonte: Renato Alves / O Tempo