A viabilidade de um protagonista da política é um processo que abrange um conjunto de variáveis: o discurso, a história, as condições em que se desenvolve a cena política, a economia, acidentes e incidentes envolvendo os atores, os dramas, angústias e expectativas das populações, os apoios e desapoios e, sobretudo, a esperança por ele encarnada.

Por isso mesmo, os cenários projetados para o amanhã são bastante nebulosos, mesmo se eventos planejados estiverem de acordo com a liturgia da política em tempos eleitorais. É tarefa das mais espinhosas prever o sucesso ou o insucesso de candidatos, ainda mais quando se vive em um país que oscila na gangorra, subindo e descendo, andando de lado como caranguejo. E, para obscurecer mais ainda a visão, o Senhor Imponderável costuma nos fazer visitas surpreendentes, entornando o caldo de uns, esquentando a água fria de outros, tornando possível o que se dava como impossível.

Vejamos o estado da economia. A opinião unânime de economistas e consultores é que a inflação logo, logo, baterá nos dois dígitos, prevendo-se um refluxo das atividades produtivas e até com viabilidade de uma recessão. Quem sofrerá mais nessa paisagem de desolação? Os mais carentes, que sentirão o peso da inflação nos alimentos, na vida cotidiana. As massas da base da pirâmide serão as mais castigadas.

E o que dirão os protagonistas: os da oposição, como a senadora Simone Tebet, que acaba se lançar candidata à presidência da República, Ciro Gomes, Sérgio Moro, Lula, entre outros, dirão que o culpado é o presidente Jair. Os setores médios saberão distinguir a linha tênue que separa a mentira da verdade, mas as massas poderão, até, esquecer de quem será a culpa se sobrar uma graninha para comprar comida. Basta serem recompensadas pelo auxílio-Brasil.

O fato é que os protagonistas usarão suas habilidades para que os discursos sejam mais aceitáveis que as promessas dos adversários. Alguns estarão relendo os preceitos de Maquiavel ou relendo o Breviário dos Políticos, do cardeal Mazarino, com sua sequência de sentenças anárquicas: “Simula & Dissimula”.

A manipulação chegará aos píncaros. Ex-condenados falarão de sua inocência e da forma torpe como foram condenados. Um candidato, apontado como culpado pelo caos reinante no país, será endeusado por simpatizantes por representar o Santo Guerreiro contra o dragão da maldade. O grupo da terceira via pregará a união dos brasileiros contra a radicalização dos polos extremos.

Quem levará a melhor nessa contenda? Aquele que melhor puder administrar a máxima de Ortega y Gasset: “O homem é o homem e a sua circunstância”.

E se acontecer mais uma visita do Senhor Imponderável da Política? Nesse caso, uma trovoada de surpresas nos aguarda. Lembro 1986, quando, sob o governo Sarney, se realizaram as eleições para governador. No Piauí, disputavam Freitas Neto (PFL), e Alberto Silva (MDB). No encerramento da campanha, estava previsto “monumental showmício” de Elba Ramalho na praça do Marquês, como anunciavam os carros de som ao longo do dia.

E nada de som chegar. Naquele tempo, os equipamentos eram gigantescos, caixas de som imensas. Caiu uma chuvarada no sertão da Bahia. As carretas atolaram, chegando em cima da hora do comício, por volta das 18 horas. Os eletricistas corriam para ligar os grossos cabos. Um toró começou a cair. A turba gritava: “Elba, Elba, Elba”. De repentes, estouros, curto-circuito, pane. “Não será possível instalar o som”, avisaram os eletricistas. Os cabos estouraram. Aflição. A multidão, dançando na chuva, pedia “Elba, Elba”. E a cantora mostrou o contrato: “sem som, não canto”. Arrumaram um banjo e ela começou a solfejar sob o alarido da massa. Para na primeira estrofe. E abre o verbo: “seus malditos, seus impiedosos, seus assassinos”. Vaias de todos os lados. O que estava acontecendo? Vi a cena até hoje viva na memória. No meio da multidão, abriam a boca de um jumento, onde enfiavam uma garrafa de cachaça. Quando Elba viu a cena, teve início a pendenga. Apupos, gritos, anticlímax. Freitas Neto, que estava na frente por 4 pontos, perdeu a eleição por pouquíssimos votos.   

Vez ou outra, perguntam: “professor, o que é o Imponderável na política?” Respondo: “um jumento embriagado no Piauí”.

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