“Mostrar a cara do Brasil” no cenário internacional sempre foi uma das prioridades do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante seus mandatos. De George W. Bush a Fidel Castro ainda em seu primeiro governo, passando por Barack Obama e Angela Merkel após sua reeleição, e agora, diante de Vladimir Putin, Xi Jinping, Volodymyr Zelensky e Joe Biden, o foco do líder petista permanece em apresentar o país ao mundo como uma nação pacificadora.

De janeiro a setembro deste ano, foram 25 viagens internacionais, com 21 países espalhados em quatro continentes – somente Oceania ficou de fora (veja o detalhamento das viagens ao final da reportagem). E a agenda ativa no exterior somente foi interrompida em função das fortes dores no quadril. Para resolver isso, o presidente precisou se submeter a uma cirurgia no final de setembro.

Mas, antes dessa pausa obrigatória, Lula conduziu duas agendas internacionais, passando por Cuba e os Estados Unidos, que custaram R$ 11,379 milhões aos cofres públicos. Os dados foram obtidos pela equipe de O TEMPO Brasília por meio de um pedido de Lei de Acesso à Informação (LAI) ao Itamaraty. Esses valores não incluem o translado aéreo, que é feito pela Força Aérea Brasileira (FAB), cujos valores são sigilosos.

Sua estada em Cuba, que se limitou a apenas dois dias entre 15 e 16 de setembro, sendo que parte desse período foi destinado ao translado para os EUA, resultou em um custo total de R$ 1,056 milhão. Já nos Estados Unidos, durante sua participação na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) entre os dias 16 e 20 de setembro, o valor desembolsado foi de R$ 10,323 milhões.

As maiores despesas foram registradas nos Estados Unidos, onde somente a quantia total da hospedagem atingiu US$ 1,265 milhão, que pela conversão em reais chega a R$ 6,214 milhões. O presidente e sua comitiva escolheram o luxuoso Hotel Lotte Palace, situado na 455 Madison Avenue, para sua estadia em Nova York.

Além disso, segundo os documentos recebidos pela reportagem, estão inclusos nesse valor gastos com serviços de intérpretes, locação de veículos e salas, além de aluguel de sistemas portáteis de interpretação e fones de ouvido. A única quantia repassada pelo MRE com as cifras em reais foi a destinada para arcar com o cerimonial: R$ 88,5 mil.

Já em Cuba, o presidente participou da cúpula do G77 e China, um dos maiores eventos multilaterais do sul global. As despesas com hospedagem da comitiva oficial, das equipes de assessoria e apoio, em Havana, foi o mais oneroso: US$ 174,9 mil, que após a conversão chega a R$ 851,6 mil.

Em Havana, também foram registradas despesas para o aluguel de veículos, locação de salas de apoio, e reserva de salas de trabalho e atendimento à imprensa. Assim como para a viagem aos EUA, o único valor fornecido pelo Itamaraty em reais foi o alocado para cobrir custos com cerimonial, de R$ 50,4 mil.

Com exceção do gasto com cerimonial, os valores fornecidos pela pasta de Relações Exteriores por meio da LAI estavam em dólar. Foram consideradas as datas de 16 de setembro de 2023 para a viagem a Cuba, e 20 de setembro para os Estados Unidos, cuja cotação estava em R$ 4,8689 e R$ 4,9125, respectivamente, para a conversão em reais.

Quem estava na comitiva

A reportagem consultou o Diário Oficial da União (DOU) e um decreto datado de 28 de setembro, que oficializou a homologação da comitiva que acompanhou o presidente Lula em suas viagens a Cuba e aos Estados Unidos. Nas duas viagens, ele foi acompanhado  pela primeira-dama, Rosângela Lula da Silva. E, segundo o decreto, sem ônus para a União.

Para Havana, além da companhia de Janja, estavam com o petista: os ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores), Nísia Trindade (Saúde), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), o líder do Governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), o assessor-chefe da assessoria especial do presidente da República, Celso Amorim, e Christian Vargas, embaixador do Brasil em Havana. Esse último também sem ônus, segundo o DOU.

Já na viagem aos Estados Unidos, a comitiva aumentou para 15 integrantes. Além de Janja, Mauro Vieira, Nísia Trindade, Jaques Wagner e Celso Amorim, que já estavam na nação caribenha, se juntaram ao grupo outros 7 ministros, a embaixadora do Brasil nos Estados Unidos, Maria Luiza Ribeiro Viotti, e o representante permanente do Brasil junto às Nações Unidas, Sérgio França Danese. Esse último, segundo o decreto, sem ônus aos cofres públicos.

Os chefes dos ministérios que estiveram em Nova York foram: os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Luiz Marinho (Trabalho), Marina Silva (Meio Ambiente), Cida Gonçalves (Mulheres), Sônia Guajajara (Povos Indígenas), Márcio Macêdo (Secretaria Geral da Presidência da República) e Paulo Pimenta (Secom).

Em breve, mais viagens nacionais e internacionais

Em recuperação desde a pausa para realização de procedimentos cirúrgicos, em 29 de setembro, o presidente já deu sinais de que não quer ficar parado por muito tempo. A próxima viagem internacional dele já tem data e local:a 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP28), em Dubai, no fim deste mês.

Dos Emirados Árabes Unidos, o desejo do chefe do Executivo é seguir para uma visita à Alemanha, em 4 e 5 de dezembro. Antes de Dubai, é esperado que Lula passe pela Arábia Saudita para tratar sobre os investimentos do país em obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Na quarta-feira (8), Lula avaliou que conseguiu restabelecer a imagem do Brasil no cenário internacional e planeja concentrar suas atividades em viagens pelo território nacional em 2024. Neste mesmo ano, ocorrerão as eleições municipais, e o PT tem como objetivo ampliar sua representatividade nas administrações municipais.

“Eu tive que me dedicar à reconstrução da imagem desse país no exterior. Esse país não era recebido por ninguém e ninguém queria vir a esse país. Era como se tivesse tido um apagão na política internacional. Então, conseguimos recuperar esse país. Agora vou ao Qatar, aos Emirados Árabes, à Arábia Saudita e à Alemanha”, afirmou.

Especialistas divergem sobre o saldo diplomático dessas viagens

Durante sua visita a Cuba, Lula participou ativamente da Cúpula do G77 e China, realizada em Havana, que teve como tema “os desafios atuais para o desenvolvimento: o papel da ciência, da tecnologia e da inovação”. Além de sua participação na cúpula, o presidente teve encontros significativos, incluindo reuniões com o presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, e outros líderes políticos e sociais do país.

No encontro com o presidente Díaz-Canel, o petista reafirmou o compromisso do Brasil com a amizade e a cooperação com o país caribenho. Essa visita representou um gesto de reaproximação entre as duas nações, que se distanciaram durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Posteriormente, nos Estados Unidos, durante a 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas, Lula participou de reuniões bilaterais com líderes de outras nações. Ele retornou ao palco da ONU após 14 anos, tendo discursado como presidente pela última vez na Assembleia Geral de 2009.

Especialistas consultados pela reportagem analisaram os custos das viagens de Lula aos dois países e a importância diplomática. Até agora, em onze meses de governo, o petista fez 25 viagens internacionais, visitando 21 países e quatro continentes.

Segundo o especialista em Direito Constitucional e Internacional, Acacio Miranda da Silva Filho, embora seja claro que é importante obter resultados concretos com essas agendas, muitas vezes é difícil prever exatamente quais serão esses resultados: “Isso ocorre em parte porque os resultados frequentemente dependem de negociações posteriores entre diplomatas e funcionários burocráticos”.

“O Brasil mantém sua relevância no cenário global em função das suas características econômicas, seu status como um mercado importante e sua produção diversificada. No entanto, ao comparar os governos de Lula e Bolsonaro, nota-se que Lula teve mais habilidade para o diálogo internacional, o que o levou a viajar mais frequentemente do que o ex-presidente”, avaliou.

No entanto, para Leonardo Velloso, advogado especializado em direito tributário, civil e penal, e Coordenador Geral da Unisuam São Cristóvão (Direito), as despesas apresentadas se mostram superiores aos valores médios observados no mercado internacional correspondente. Para ele, não há uma justificativa plausível para tais gastos. Conforme Velloso, “isso pode indicar uma má gestão dos recursos públicos, falta de transparência e de controle”.

Fonte: O Tempo

 

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