O Dia Mundial de Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa, que ocorre neste sábado (15), joga luz sobre um problema cada vez mais evidente na sociedade. Somente entre janeiro e abril deste ano, 34.641 pessoas com idade igual ou superior a 60 anos sofreram algum tipo de violência em Minas Gerais. Isso representa 12 novas vítimas, em média, a cada hora.

As estatísticas também apontam a mesma questão pelo país. Em 2023, foram registradas 143.595 violações de direitos no Brasil, um aumento de quase 50 mil casos em relação a 2022, ano que somou 95.796. Mas o número pode ser ainda maior, se for considerada a subnotificação.

Os dados foram revelados pelo estudo “Denúncias de violência ao idoso no período de 2020 a 2023 na perspectiva da bioética”, realizado por pesquisadoras da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Alessandra Camacho, professora da Escola de Enfermagem da UFF e do Programa Acadêmico em Ciências do Cuidado, conta que a motivação para o estudo surgiu em 2020, durante o período da pandemia de COVID-19. “Surgiu a ideia de realizar um acompanhamento. A proposta foi justamente fazer uma análise no período de 2020 a 2023, para verificar se após o período pandêmico essas denúncias haviam diminuído. E nós verificamos que pelo contrário: aumentaram”, relata Alessandra Camacho.

Entretanto, a pesquisadora não relaciona o aumento das denúncias com maior incidência de violência contra pessoas idosas, mas, sim, com  maior conscientização e divulgação dos canais de comunicação com as autoridades.

Ambiente residencial

Um dos dados mais relevantes da pesquisa mostra a relação existente entre a vítima e o agressor, revelando que grande parte das situações de violência são protagonizadas pela própria família. Em 56,29% dos casos registrados em 2023, o suspeito de praticar a violência eram os próprios filhos das vítimas, e em 16,11%, outros familiares.

Desse modo, o documento apontou que quase a totalidade das violações têm incidência no ambiente residencial: 89,28% das denúncias tiveram como cenário a própria casa do idoso ou o imóvel onde residem a vítima e o suspeito.

Cerca de 30% das vítimas tinham 80 anos ou mais, uma diferença expressiva para a segunda faixa etária que mais denunciou violências: pessoas com idade entre 70 e 74 anos representam 17,85%. Ainda foi evidenciado que as mulheres idosas são as principais vítimas: cerca de 7 a cada 10 eram do gênero feminino.

O abandono é uma das formas mais comuns de violência contra a pessoa idosa. Segundo a cartilha informativa, também fruto da parceria entre a UFF e a UERJ, essa violência se caracteriza por omissões, ausência de apoio, privações de cuidados básicos e negligências com necessidades básicas como a higiene, a alimentação e a administração correta de medicamentos.

Foi o que aconteceu com uma idosa de 74 anos, que vive em Minas e foi abandonada pela família por uma semana no início deste mês. Ao passar mal pela manhã, ela foi levada pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) ao hospital da cidade e recebeu alta médica no mesmo dia. Ao retornar para casa, não encontrou mais a neta que cuidava dela.

Nenhum outro familiar a visitou ou ofereceu assistência nos dias que se seguiram. Desesperada pela situação de abandono, ela entrou em contato com a Polícia Militar (PM), que assumiu a responsabilidade de cuidar da idosa. O caso foi registrado em Resende Costa, no Campo das Vertentes.

A violência física também é frequente. Ela ocorre quando uma pessoa faz uso da força física para forçar ou impedir o idoso de fazer algo, incapacitar fisicamente o idoso, realizar ações que promovam lesões ou traumas e que podem levar à morte da vítima.

Foi o desfecho de um caso que aconteceu em Juiz de Fora, na Zona da Mata. O corpo de uma idosa, de 64, foi encontrado com sinais de violência em uma moradia. Segundo o boletim de ocorrência, os militares acharam o corpo da mulher caído na sala, com muito sangue ao redor e lesões no pescoço e nas costas.

A suspeita é de que a nora e a neta tenham cometido o crime, uma vez que familiares da idosa contaram que a vítima era credora de uma dívida contraída por elas, e que as duas estariam negociando o pagamento dessa dívida, em parcelas.

Sociedade em xeque

A violência contra os idosos está diretamente ligada com o etarismo, ou seja, a discriminação ou preconceito contra uma pessoa com base na sua idade. Esse posicionamento afasta a pessoa idosa de fazer atividades que está apta a realizar como trabalho, atividades físicas e até mesmo em relacionamentos amorosos, somente pela justificativa de que está “velha”.

“Algumas pessoas relacionam o idoso com incapacidade. E a gente sabe que não é bem assim. Sabemos que mudou muito o perfil do idoso da década de 1980 para o idoso de atualmente”, declara Alessandra Camacho. “Eu estou com 47 anos. Em um futuro bem próximo vou estar idosa, né? É um processo que tem que ser levado de maneira natural e é preciso que a nossa sociedade esteja preparada. Que seja algo progressivo, natural e educacional. Com uma sociedade também mais empática”, defende a pesquisadora.

A afirmação faz coro com o que acredita Maria Machado Cota, presidente da Rede Ibero-Americana de Associações de Idosos do Brasil (RIAAM-Brasil): “Eu tenho privilégio de ser uma idosa saudável e ativa. Nem me lembro que eu tenho a idade que tenho, e são só 75 anos. Eu me lembro disso quando eu falo de idade. Acho que sou uma pessoa tão produtiva, ou mais produtiva, do que muita gente de 30, 40 anos”.

Fonte: Estado de Minas

 

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