O pedreiro Hélio Francisco da Costa estranhou quando, há cerca de três anos, começou a apresentar rouquidão constante. Foi quando descobriu um câncer de laringe e perdeu a capacidade de se comunicar por meio da fala. O paciente é um dos quase 23 mil casos de câncer de cabeça e pescoço registrados em Minas Gerais desde 2019. Ao passar pelo tratamento, escapou do pior desfecho: por dia, quatro pessoas morrem da doença no estado – foram 8.645 óbitos em cinco anos.

Este mês é marcado pela campanha Julho Verde, sobre a importância da prevenção e diagnóstico precoce do câncer na região da cabeça e pescoço. A doença, que é causada, principalmente, pelo consumo exagerado de cigarros e bebidas alcoólicas, atinge órgãos como boca, língua, laringe e tireoide.

Conforme a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), os casos mais comuns ocorrem na cavidade oral. De 2019 até o último registro de 2024, foram 3.504 diagnósticos de câncer de orofaringe e 2.976 casos da doença na língua. Para se ter ideia, das 30 mil internações associadas ao câncer de cabeça e pescoço nestes cinco anos, o tumor estava na boca em 66% delas.

As mortes, no entanto, são evitáveis. Esse é o quinto tipo de câncer mais incidente no Brasil, mas seu índice de cura pode chegar a 90% se tratado precocemente. “Quando o diagnóstico é feito na fase inicial da doença, as chances de cura são muito altas”, garante o médico cirurgião Guilherme de Souza Silva, coordenador do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital Alberto Cavalcanti (HAC).

Hélio Francisco da Costa demorou a descobrir a doença, mas foi um dos 13 pacientes do hospital que receberam uma laringe eletrônica em 2023. “No início foi muito difícil, eu ficava muito nervoso, já que com a retirada das cordas vocais eu não podia mais falar. Agora, melhorou 100%. Me comunico com qualquer pessoa, sem nenhum problema”, relata ele, que ainda frequenta a unidade para consultas regulares.

 

Laringes eletrônicas

O Hospital Alberto Cavalcanti, da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), foi o primeiro hospital público estadual a entregar laringes eletrônicas. O investimento total foi de R$ 50 mil na compra das 20 primeiras unidades do equipamento.

Em 2024, oito novas laringes eletrônicas já foram entregues e outras duas estão previstas para os próximos dias. “Todos os pacientes que foram submetidos a tratamentos que resultaram na retirada completa das cordas vocais são elegíveis ao uso de laringe eletrônica. Isto melhora a qualidade de vida dos pacientes e familiares, principalmente daqueles com dificuldades de comunicação escrita”, afirma o cirurgião Souza Silva.

O Alberto Cavalcanti é referência na oncologia com atendimento 100% pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em média, são realizadas 166 consultas e 37 cirurgias por mês na unidade, somente pelos cirurgiões de cabeça e pescoço. “Após o tratamento oncológico específico, é feito um acompanhamento regular do paciente na unidade”, continua o médico.

 

Fatores de risco: abuso de álcool e cigarros

Esse tipo de câncer atinge, em sua maioria, homens acima de 50 anos. Todavia, o médico alerta para o crescimento do número de mulheres acometidas pela doença, que é causada, em grande parte, pelo consumo exagerado de cigarros e bebidas alcoólicas. O número de casos em fumantes chega a ser de duas a três vezes maior que entre não fumantes.

“Há alguns anos, a proporção era de 11 homens para cada mulher. Hoje, com o aumento no número de mulheres fazendo uso de álcool e cigarros, essa proporção diminuiu e temos três homens para cada mulher com a doença”, ressalta Guilherme de Souza Silva, que coordena o Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do HAC.

Além disso, outros fatores de risco são o uso de cigarros eletrônicos ou de narguilé, exposição ao sol sem proteção, que representa risco importante para o câncer de lábio, e infecção pelo vírus HPV, que está relacionada a alguns casos de câncer de orofaringe quando transmitida por sexo oral. “A principal forma de prevenção é não fumar nem consumir bebidas alcoólicas. Além disso, a vacina contra HPV também ajuda a prevenir”, afirma o médico.

 

Sintomas suspeitos

Os primeiros sinais que podem indicar câncer de cabeça e pescoço são feridas na boca e garganta que não cicatrizam, dificuldade e dor para engolir e alterações na voz, podendo surgir ainda nódulos no pescoço e sintomas como falta de ar.

“Diante de qualquer lesão no lábio e na cavidade oral que não cicatrize em até 15 dias, a orientação é procurar atendimento em uma unidade básica de saúde para avaliação com um profissional cirurgião-dentista, que vai realizar o exame clínico da boca e, se necessário, o encaminhamento para biópsia para estabelecimento do diagnóstico”, destaca a coordenadora de Saúde Bucal e Ações Integradas da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), Jacqueline Silva Santos.

 

Prevenção

Segundo a coordenadora, as biópsias podem ser realizadas nas unidades básicas de saúde pelo cirurgião-dentista ou nos Centros de Especialidades Odontológicas. “Além disso, as pessoas com maior risco para desenvolver câncer de boca, como os fumantes e etilistas, devem fazer visitas periódicas ao cirurgião-dentista para um cuidadoso exame de rotina, pois as chances de cura são maiores nas fases iniciais da doença e quando o tratamento é adequado e oportuno”, orienta.

 

Tratamento

O SUS oferece tratamento tanto para quem quer parar de fumar, por meio do Programa Nacional de Controle do Tabagismo nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), quanto para quem foi diagnosticado com a doença, nas Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) e Centros de Assistência Especializada em Oncologia (Cacon).

Essas unidades realizam o tratamento para o câncer de cabeça e pescoço, com atendimento integral e gratuito para todos os cidadãos. O tratamento pode variar de acordo com o estágio do câncer, a localização específica e a saúde geral do paciente.

Atualmente, em Minas Gerais, o tratamento do câncer de cabeça e pescoço é realizado em 17 municípios e são responsáveis pela demanda de todo o Estado. Nos últimos 12 meses (de maio de 2023 a abril de 2024), foram realizados 8.471 procedimentos relacionados ao câncer de cabeça e pescoço, sendo 1.356 cirurgias, 5.305 quimioterapias e 1.810 radioterapias.

 

Fonte: O Tempo

 

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