O benzimento, prática ancestral presente em diversas culturas, segue vivo no Brasil por meio das benzedeiras guardiãs de um saber popular que atravessa gerações. Em Minas Gerais, essa tradição pode ganhar novo fôlego com o Projeto de Lei (PL 2024/2024), que propõe reconhecer as benzedeiras e a benzeção como patrimônio cultural imaterial do estado. A proposta, de autoria da deputada estadual Ione Pinheiro (União), tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa.
A prática do benzimento no Brasil surgiu da fusão de diferentes tradições. Mistura rezas católicas trazidas pelos portugueses, saberes indígenas relacionados ao uso de ervas e rituais de cura, além de influências das matrizes africanas. Esse sincretismo se consolidou como forma de cuidado em comunidades carentes de assistência médica, onde a fé e a sabedoria popular eram, muitas vezes, as únicas alternativas disponíveis.
Atualmente, a benzeção é reconhecida oficialmente em algumas localidades. A benzeção da Comunidade Quilombola dos Arturos, em Contagem, por exemplo, é registrada como Patrimônio Cultural Imaterial e inscrita no livro das celebrações do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG) desde 2014.
Mais do que um ato religioso, o benzimento é visto como gesto de acolhimento, afeto e cuidado. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em 2020 mostrou que 40% dos brasileiros acreditam em práticas de cura espiritual como passes, rezas e benzimentos número que pode ser ainda maior hoje, diante do crescente interesse por espiritualidade, terapias alternativas e saúde mental.
Embora alguns apontem que a tradição das benzedeiras está desaparecendo, há quem defenda que ela está, na verdade, se transformando para acompanhar os novos tempos. Um exemplo disso é a psicoterapeuta e benzedeira Katherine Borborema, de 44 anos, que aprendeu a benzer ainda criança, no colo da avó. A tradição veio de família: sua mãe também era benzedeira. Hoje, Katherine realiza atendimentos online e por telefone, adaptando a prática aos formatos modernos de cuidado.
Para ela, o benzimento pode se integrar a terapias contemporâneas como o reiki e a constelação familiar. Em seu consultório, a prática tradicional é associada a abordagens energéticas mais conhecidas no meio terapêutico atual. “A pessoa está ali deitada recebendo energizações e, de repente, se eu sentir necessidade, já faço o benzimento nela”, relata Katherine, que atende pacientes de outros estados e até celebridades como os cantores Gabi Martins e Tierry, e a ex-BBB Letícia Santiago.
Entre os benefícios do benzimento, ela destaca: afastar energias negativas e cargas pesadas, proteção contra inveja e quebranto, fortalecimento da fé, alívio de dores físicas e espirituais, redução da ansiedade, sensação de acolhimento e equilíbrio emocional. Segundo ela, muitos pacientes também relatam melhora no sono e na imunidade.
Enquanto a ciência busca respostas para as questões da mente e do corpo, o benzimento permanece como uma forma de cuidado que une espiritualidade, escuta e conexão com o sagrado. A tradição se mostra resistente e, ao mesmo tempo, adaptável, mantendo viva uma herança ancestral que segue confortando e protegendo aqueles que acreditam em sua força.
Com a possibilidade de se tornar patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais, a prática ganha visibilidade e reconhecimento oficial, reafirmando seu valor histórico, social e espiritual para as comunidades mineiras e brasileiras.
Com informações do jornal O Tempo