A concessão da graça (perdão individual da pena) no dia 21.04 pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, ao deputado federal, Daniel Silveira, para livrá-lo do cumprimento das penas impostas no dia 20.04, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de 8 anos e 9 meses de reclusão, gerou precedentes jurídicos e políticos impensáveis até pouco tempo atrás.

A graça, diferentemente do indulto ou da anistia, alcança somente uma pessoa e não tem caráter geral. Seu alcance individual desvirtua toda a razão republicana de um governo, a qual deve ser para o bem de todos.

A condenação foi devida a vídeo publicado, pelo deputado, com ameaças e ofensas aos ministros do STF, com defesa da adoção de medidas antidemocráticas, com ataques ao Estado Democrático de Direito e à independência dos poderes. O deputado afirma os onze ministros do STF “não servem pra porra nenhuma pra esse país”, “não têm caráter, nem escrúpulo nem moral” e deveriam ser destituídos para a nomeação de outros “onze novos ministros” e disse desejar “um novo AI-5” para essa finalidade. Além disso, afirmou já ter imaginado o ministro Edson Fachin “levando uma surra… como todos os integrantes dessa Corte aí”.

Essa atitude com o STF deveria ser repudiada pelos poderes da República, em nome da preservação de todos, pois imagine se, em nome da liberdade de expressão, virar rotina ofensas a outras instituições, como a Presidência da República, as Forças Armadas, etc.

Além disso, no dia 26.04, o ministro Alexandre de Moraes, deu prazo para a defesa do deputado se manifestar sobre o descumprimento de medidas cautelares, relatadas nos autos: “(a) descumprimento das medidas cautelares de monitoramento eletrônico, nos dias 6/4/2022, 10/4/2022, 11/4/2022, 14/4/2022, 15/4/2022, 16/4/2022, 17/4/2022, 18/4/2022, 19/4/2022, 20/4/2022, 21/4/2022, 22/4/2022, 23/4/2022, 24/4/2022 e 25/4/2022…; (b) participação do réu em evento político público realizado em 31/3/2022, no Palácio do Planalto…; (c) concessão de entrevista coletiva no dia 30/3/2022, em seu gabinete na Câmara dos Deputados…

Estranha a concessão da graça para alguém com essa longa lista de desrespeito a decisões do judiciário.

Poderia até achar aceitável a concessão da graça a uma pessoa com serviços prestados para a coletividade, com reputação ilibada e que, eventualmente, cometeu um erro na vida. Entretanto, a graça ao deputado foi um louvor público às suas atitudes anti-sociais.

O ex-presidente Lula poderia ter concedido a graça a José Dirceu ou a ex-presidente Dilma Rousseff poderia ter agraciado ao próprio Lula, mas os dois não o fizeram.

Essa graça concedida abre um precedente negativo contra a ordem social, onde os amigos do presidente poderão fazer ofensas às leis e, caso condenados, poderão ser agraciados com a graça presidencial, situação própria de um país anárquico, onde as pessoas não respeitam as regras estabelecidas para o bem público.

Euler Antônio Vespúcio – advogado tributarista

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